Não, não. O caso não tem nada a ver com o prefeito da cidade de Caxambu envolvido em escândalo. Aqui contamos outra história. Célia Ayres de Lima/Araújo , quando saia às ruas, ficava intrigada e se perguntava por que os amigos do irmão Sílvio o tratavam de "prefeito". "- Ô, Prefeito!” Que prefeito era esse? Ficou sabendo mais tarde que era o prefeito do estabelecimento, pois ele não saia de lá. E precisaram se passar quase 60 anos para eu saber que o meu tio era o... o rei do bordel da cidade...
Sílvio Ayres de Lima era o galã da Caxambu dos anos de 1930, ninguém podia negar. Jovem, sempre comportado e discreto, aliás, discretíssimo, nunca tinha "dado na vista". Mas ele tinha um lado que ninguém conhecia: gostava das "mulheres da vida". Quase ninguém na família sabia, até que... até que a nossa enciclopédia a familiar, Célia Ayres de Lima /Araújo, me contou toda a história.
Ah, mas essa não é uma história qualquer, é uma história de amor, sim, sim! E se histórias de amor entre prostitutas e seus clientes são contadas com todo o glamour de Hollywood, com atores bonitos e indicados para o Oscar (e ganharam!), por que não uma história de vida real a gente aqui na Família Ayres não iria contar?
Os nossos protagonistas não eram tão glamourosos quanto a prostituta Julia Roberts e o homem de negócios Richard Gere, do filme Oh, Pretty Woman, e sim Sílvio Ayres, o barbeiro da cidade de Caxambu, e Pinduca, a prostituta. Infelizmente não conhecemos o seu verdadeiro nome, então escrevemos que ela foi a pessoa pela qual meu tio se apaixonou. Assim como atores num filme de vida em preto e branco, nos anos de 1930, eles foram protagonistas de cenas de sexo e amor na vida real, amor que se tornou devoção para toda a vida.
Aquele lado era animado
E onde era mesmo a... a... Zona de Caxambu? Pois existiu e ficava ali na rua Costa Guedes (ai, ai, a memória do velho Guedes), no terreno onde era a casa de Sílvia Figueiredo, vizinha da casa do Dr. Paiva. A localização do prostíbulo era incomum, pois ficava quase no centro da cidade. Uma das pouquíssimas testemunhas da época, hoje do alto dos seus 97 anos, discretíssima no uso de suas palavras, lembra que... "aquele lado era animado". Então era lá mesmo a... Zona, tia Célia não se enganou.
Maria Boiadeira
Temos mais testemunhas. Outras pessoas mais jovens confirmaram a existência de outro bordel em diferente lugar da cidade, como um que ficava atrás da chácara Rosalã, num bambuzal, mas isso já era nos anos 80. Mas, novamente aqui, como o Blog é interativo, um leitor que... esteve no local, vem "atualizar" nossas informações e dizer que o do bambuzal já funcionava antes do ano de 1972. Em Baependi as luzes vermelhas eram acesas pra cima da Igreja Nhá Chica. Ah, todo lugar tem o seu. E as mais divertidas lembranças vieram quando conversei com Ruth Villara Viotti. Ela não se recordava do nome da cafetina-mor da cidade. Vocês me perguntariam: por que a Ruth foi parar no texto? Claro, quem mais dessa época é vivo para nos contar as histórias dos anos 30/40 senão a tia Célia Ayres e a Ruth Villara? Foram minutos de conversa e ah!, “Maria Boiadeira!”, gritou a Ruth do outro lado da linha, e caímos na gargalhada. Ela conheceu Maria já grisalha, e conta que era uma dama distintíssima, fina. Quando passava pelas ruas era cumprimentada com respeito. Outros tempos...
Voltemos a Pinduca. Ela trabalhava no local com a colega, a Maria Boiadeira, quando o "estabelecimento" mudou-se para o bairro Caixa D`Agua, du as ruas paralelas, acima da Igreja Matriz, para quem ia morro acima, e então resolveram exercer a profissão em São Lourenço. Na oportunidade, Sílvio fez a proposta para Pinduca deixar a profissão, "oficializar" a relação e irem morar juntos, juntar os panos, como se dizia. Ele ainda morava com a mãe, e uma conversa com Vó Gervásia sobre o assunto seria impossível. Não seria moral ter uma ex-prostituta como enteada. A casa viria abaixo. Dividido, Sílvio acabou comprando uma pequena casa e foram morar juntos. Casar? Oh! Na casa materna nenhuma palavra sobre Pinduca. Passados os anos, Vó Gervásia veio a falecer. Sílvio fez então uma consulta às irmãs mais próximas, Mercedes Soler e Célia, e elas consentiram com a mudança. Finalmente Pinduca pôde se mudar para a Rua Quintino Bocaiúva, 113.
Pinduca sempre se lembrava de Célia e a presenteava com doces de laranja e cidra. Num gesto de solidariedade e reconhecimento pelo verdadeiro afeto que ela tinha pelo seu irmão, Célia a convidou um dia para dar um passeio de carro pela cidade. Na ocasião, Pinduca não se achou digna de entrar no carro, mas foi convencida pelas sábias palavras de Célia: "Para Jesus todos somos iguais. O pecado e a santidade não estão na roupa, estão no pensamento". Ela, que nunca mais saiu de casa, quase não reconheceu a cidade e, passando em frente aos prédios, relembrou seus tempos de mocidade. Em idade avançada, foi acometida pelo Mal de Alzheimer e cuidada por Sílvio até o dia de sua morte. Se isso não foi amor, então o que foi?
Foto:Arquivo privado de Celia Ayres de Lima/Araujo
Agradecimentos:
A família sente honrada em poder contar com as memórias de Celia Ayres de Lima/Araujo e Ruth Villara Viotti. Nossas conversas telefônicas Brasil/Alemanha, em 19/22 de agosto de 2017.
Edição e revisão:
Paulo Barcala
Edição e revisão:
Paulo Barcala
Adorei e emocionei com essa história e com todas as outras que me fazem lembrar a saudosa Caxambu da minha infância. Um caso de amor verdadeiro, como somente poderia ocorrer lá.
ResponderExcluirMarcinha, obrigado pela visita e os cumprimentos. Solange
ExcluirSolange o bordel do bambuzal era lá do outro lado da Chácara Rosalina desde antes de 1972 que foi quando iniciei minha vida mundana lá RS...
ResponderExcluirAh, então você conheceu os "tempos modernos" do p*. Vou atualizar as informações, isto é "antes de 1972",rsrs... Vai para o texto, pois você sabe, somos interativos com os leitores. Agradecida. Solange Aires
ExcluirNa década de 70 me lembro do prostibulo em Baependi de nome Salica e da casa no Caxambú Velho de nome Sônia. Acho que eram as chefonas do ambiente.
ResponderExcluirDona Carmen, esposa do seu tio Samuel Ayres, me contava essa história, não com essa riqueza de detalhes, mas dizia que ele era apaixonado por ela e tinha tanto ciúme que não deixava ela sair, vai ver por isso ela ficou encantada com o passeio da dona Célia.
ResponderExcluirAcho suas pesquisas sobre a família Ayres, maravilhosas e interessantes parabéns
Nasci (1950) e fui criado na rua Costa Guedes 107. A minha casa ainda está lá e pertence a minha família. Convivi com dona Silvia Figueiredo, Dr. Lizandro Carneiro e seus filhos. Éramos vizinhos do Dr. Paiva. Já não existia a zona.
ResponderExcluirSim, o… “ estabelecimento “ foi muito antes desativado, ou melhor, mudaram-se.
ExcluirAmei essa história. O verdadeiro amor supera todo preconceito.
ResponderExcluirAdorei essa história verdadeira e romântica ao extremo! Afinal, não deve ter sido fácil "aturar" os fofoqueiros (ou fofoqueiras), mal intencionados!!!!
ResponderExcluirSolange, amei seu texto e também a história... que só fui ler agora... que bom que você postou de novo!!! Recordar é viver!!🌷💕
ResponderExcluirSolange como sempre excelente texto com riquezas de detalhes até onde era sabido... Eu viajando aqui como seria nos bastidores dessa estória... Tio Silvio deve ter arrasado muitos corações!??
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