sexta-feira, 26 de maio de 2017

A piscina do parque das águas de Caxambu / Mergulhando na saúde


À esquerda, Expedito, aluno da Funabem; Solange Ayres e Rosangela dos Santos Ayres à direita

Se vamos falar de piscina, falaremos de água. Sem ela, claro, não teríamos a... piscina. Mas, se tratando de piscina, ainda mais no Parque da Águas de Caxambu, onde poderíamos mergulhar em  puríssimas águas minerais, vindas de seu próprio manancial? Não é para menos, a cidade tem o privilégio de possuir 12 fontes, cada uma com seu gosto e caraterísticas próprias e é a maior estancia hidromineral do planeta! Esta história foi sempre contada por meu pai José Ayres, que não cansava de divulgar as propriedades terapêuticas das águas, presentes todos os dias na nossa mesa. Nadar nelas então? Uau! Um luxo.

Construída no ano de 1937, e inaugurada em janeiro de 1938, foi para a época uma "sensação": a única piscina de água mineral da América Latina! Com 25 metros de extensão e 12 metros de largura ela   pode não somente ser considerada um lugar para a prática do esporte e lazer, mas um lugar de cura.  Sua construção foi na gestão administrativa de Edmundo Dantas. O nome do parque foi uma homenagem com toda razão ao médico, chefe do Posto de Saúde, prefeito eleito pelo PSD, na gestão de 1947/51:  Dr. Lisandro Carneiro Guimarães. As suas águas são provenientes das fontes Mayrink e possuem alto teor de radioatividade. Sua qualidade foi testada e garantida "isentas de germes" por Martin Fiker (1868-1950) bacteriologista alemão, que dirigiu entre os anos de 1926 até a Segunda Guerra,  o Instituto de Microbiologia  Kaisel-Wilhelm, em São Paulo, onde tinha também seu laboratório de análises químicas e bacteriológicas.
A composição da água que enche a piscina é complexa e é resultante da combinação de muitos fatores que a torna particular. Ela é uma mistura de elementos químicos, gasosos e proporcionando vitalidade a quem nela se banha. O efeito é sentido no corpo por fora e por dentro.


Pura medicina

As águas provém das fontes chamadas hipotermais, geologicamente definidas como águas que emergem a temperaturas inferiores a 25°. "As do parque chegam à superfície com 26 ° e perde naturalmente a temperatura passando para 15° a 20° ideais para banho de pacientes com nevropatias", assim relatou o jornal Gazeta de Noticias, em 1937. Os especialistas da época já lhe conferiam os poderes terapêuticos: "Por outro lado a água empregada na piscina de Caxambu contém gaz carbônico em estado nascente. Embora com notável superfície de evaporação, teremos sempre o ácido carbônico na água e sabe-se hoje da importante dedução deste facto." E continua:
"Considerando-se a pelle como órgão de secreção e, sabendo-se que a excitação cutânea vai estimular por esse meio indirectamente outras funções, activando o metabolismo é de se criar na indicação tônica dos banhos da piscina."
Mergulhando de cabeça 

Com todo o receituário acima válidos até hoje, só reforçam os argumentos para mergulharmos de cabeça nela.  Uma piscina pública com essas características não é para qualquer cidade. Caxambu possui uma. Ir à piscina era um acontecimento na nossa infância e adolescência, e era a atração dos fins de semana, principalmente nos meses de verão. O preço, hum... salgado! Eu tinha que escolher ou ir no sábado, ou domingo. Para dois dias consecutivos o dinheiro não dava. E o dia começava cedo: 8.00 horas da manhã  estava eu lá já na porta, excepcionalmente às 8:30, e saia somente quando aquela campainha soava e a Terezinha vinha tentar recolher os últimos renitentes a sairem da água. E quando batia aquela fome, íamos nós comprar os maravilhosos pasteizinhos de nata feitos no quiosque comandado pela Família Figueiredo. Quentinhos, saídos do forno, eram uma maravilha para matar a fome até chegar em casa.

E tinha espetáculo grátis! Do Trampolim, altíssimo, os jovens mais corajosos ensaiavam os seus saltos acrobáticos para os veranistas e platéia aquática. Luizinho, apelidado de Tarzan, com aquele shortinho de oncinha, se preparava para o salto. Suspense. Claro que havia o suspense para que todos os olhos tivessem tempo de se voltarem para o trampolim e para o saltador. Tchibum! Então o herói mergulhava nos seus 3 metros de profundidade. Não havia aplausos, mas a platéia gostava.

Jogadores da seleção na piscina


E não esqueçamos que a piscina foi palco para a história esportiva da cidade. Em várias ocasiões Caxambu recebeu da Seleção Brasileira de jogadores que se prepararam para competições a nível internacional como a Copa Mundial de Futebol de 1938, realizado na França . Eles ficaram hospedados nos Hotéis Glória e Lopes. As águas não fizeram milagres para a saúde dos jogadores, nem para o placar pois o Brasil perdeu para o time italiano. Eles também estiveram na cidade, em 1945. E desta vez o "scratch" brasileiro se hospedou no Hotel Marques, em preparação para o campeonato Sul-Americano, no Chile. Para a Copa de 1954, na Suíça, os jogadores ficaram hospedados no Hotel Palace e, em 1966, no Hotel Glória. Naquele ano a seleção tinha em sua equipe Pelé, Tostão e Garrincha. Com os treinos e a boa comida, segundo o noticiário, uns emagreceram outros engordaram, mas todos se esbaldaram nas águas de nossa piscina.  Ah, se esbaldaram.

Festa à beira da piscina/ Estrelas, galãs e corrida de sacos no Festival de cinema de Caxambu de 1956


 
Em um sábado de 21 de abril de 1956 o Parque das Águas da cidade recebeu os artistas famosos, que participaram de uma festa à beira da piscina, parte das comemorações festivas que envolvia o Festival de Cinema. Às 10:00 horas da manhã foram realizadas algumas competições, digamos, "curiosas" para o evento, mas não menos divertidas: Uma corrida de sacos animou os artistas que não se fizeram de rogados. Muitos caíram na água, nas competições de 50 metros. Na foto, alto a esquerda, Marlene; baixo à direita, Margot Morel, a rainha do mambo;  à direita ao alto, o galã da época Anselmo Duarte; abaixo à esquerda, Adelaide Chiozzo e Lurdes Maya em desabala correria à beira da piscina.



Atletas X escorregadores

Mas mais uma vez o desconhecimento de patrimônio histórico fez sua vítima: retiraram o trampolim. Primeiro foi a parte mais alta, depois, ele todo.  Sem o histórico trampolim a piscina perdeu um pouco do seu charme. Ele foi substituído por um escorregador. Ah, já não podemos observar mais os corajosos e verdadeiros atletas. Na época os saltadores eram esperados com um certo suspense e a gente segurava a respiração. O escorregador não tem graça. O povo só grita e escorrega. Ou vice-versa.

Nota: Este texto foi escrito em 2017, e acredito que houve modificações, quando ao tal escorregador.

Fotos:
Fotos Antigas de Caxambu
Arquivo privado: Expedito, aluno da antiga Escola Wenceslau Braz, a autora e Rosangela dos Santos Ayres
Fotógrafo: Minininho.
Fonte 
Jornal A Noite, 1937
Gazeta de notícias, 1937
Nosso Jornal/ Caldas de Sao Pedro, 1938
Jornal dos Esportes, 1945
A Batalha, RJ, 1940

domingo, 21 de maio de 2017

Coroação na cidade de Caxambu/ Os Anjos sem asas/ Parte 2


As Coroações do mês de maio estão sempre associadas aos anjos com asas, às meninas filhas das mães que organizavam a festa no mês de de Maria. Mas havia dias em que a cidade de Caxambu   fazia diferente. Numa rara foto, a supresa: A coroação  encenada apenas por meninos, na década de 1960, organizada pela festeira e professora Lourdes Silva. Como satisfazer as mães, cujos filhos eram homens e que também queriam "coroar"? Então temos aqui uma rara oportunidade de ver que os meninos também podiam. Como o fotógrafo nem sempre estava de plantão, muitas dessas coroações de meninos não foram documentadas. Um dia no mês era reservado a eles.

Serrote no pescoço

Para contar alguns detalhes das histórias, pedimos sempre auxílio ajuda e, desta vez foi Julio Jeha que contou das suas. Ele também participou de um "quadro" juntamente com a Telma Figueiredo na representação bíblica de José, o carpinteiro, o pai do menino Jesus. As cenas eram sem movimento, ali, tudo paradinho. Mas como as crianças "não tinham sossego", diziam na época, Julio não gostou da cena ensaiada e resolveu passar o serrote no próprio pescoço, antes das cortinas serem abertas. Não, não, foi tentativa de suicídio, nem teve sangue, pois o serrote estava do lado contrário. As crianças se  divertiam. A cena foi mais que hilária e, leitores, como veem, até hoje estamos aqui lembrando dela. Voltando às festeiras...

As festeiras mais conhecidas que organizavam as coroações compostas de meninos eram dona Zezé Pertele  mãe do Zezinho Dantas e de dona Ieda Dantas, minha madrinha de batismo, Edimundinho Dantas até porque elas tinham meninos.  Interessantemente todos vestidos a caráter, não com asas, mas em "mini-ternos" com gravatinhas borboleta e... calças curtas! Quanto sofrimento enfrentando o frio do mês de maio em calças curtas! Mas tudo pelo espetáculo. O Quadro do dia também foi ocupado pelos representantes do sexo masculino em miniatura. Uma jóia! A cena foi fotografada no exato momento que a cortina se abriu e se via o Quadro. Uns de cima olhavam para baixo e os de baixo olhavam para cima. Lindeza! Era a apoteose. 

Fotos:
Fotos Antigas de Caxambu
Agradecimentos:
Julio Jeha e suas lembranças 

domingo, 14 de maio de 2017

As coroações do mês de maio em Caxambu/Os anjos com asas / Parte 1

"A Matriz Nossa Senhora dos Remédios de Caxambu, no mês de maio, era pura festa. Todos os dias do mês dedicados a Virgem Maria, revezando entre a Igreja Matriz e a Igreja Santa Izabel, interligadas por uma rua: a Matriz embaixo, no centro da cidade e a Igreja escadaria acima, lá em cima, atrás do cruzeiro. A coroação na Igreja Santa Izabel, mais simples, mas a coroação na Matriz, verdadeiro evento."

Hoje mais uma vez, vamos pedir ajuda à Janice Drumond, a nossa vizinha de frente, lá da rua Quintino Bocaiúva, relembrando os memoráveis dias de maio, quando as crianças podiam brincar por algumas horas de serem anjos. E... Não era um "anjo" esta menina?

A missa começava às oito da noite e desde as sete a fila de anjos começava a engrossar. Nossas mães se esmeravam, caprichavam nas roupas de cetim. A minha era azul celeste, com peitilho todo trabalhado em “casa de abelha” feita pela mãe do Faridinho Cury, uma estrelinha prateada em cada arremate, as asinhas de plumas de ganso vinham de longe, a gente cheia de agasalho por baixo da roupa, um frio cortante de começo de inverno, a gente tiritando na fila, mas firme ali porque sabia da importância do evento.

Cada dia um festeiro e tinha festeiro que era muito concorrido. Ser festeiro era muito importante porque era ele quem determinava os papéis, que escolhia qual anjo poria a palma, qual jogaria as pétalas de flores do cestinho, quem colocaria a coroa na cabeça da nossa senhora, quem participaria do quadro vivo e... O mais importante... De que tipo seria o cartucho. Sim, o cartucho nosso principal interesse. Aquele cone cheio de gostosuras era nossa recompensa pelo incomodo da roupa e o frio. Talvez por isso a festeira mais aguardada era a Maria Boleira. O dia que ela era festeira, os cartuchos eram sempre garantia de surpresas.

Coroação causa traumas

Minha mãe Dona Dolores, ex “filha de Maria”, uma das fundadoras da Ação Católica na cidade, sempre me levava, deixando marcados em mim estes retalhos de memória que me fazem até hoje ter no céu dos amigos, todos aqueles anjos que compunham a enorme fila de coroação do mês de maio, em Caxambu. Cumpri com todos os papéis, pus palma, pus coroa, joguei flores e participei dos quadros vivos.

Dois traumas ficaram bem marcadas na mente. O primeiro foi no dia em que minha mãe foi festeira na Igreja Santa Izabel e que realizei o sonho de por a coroa, diga-se de passagem, honra máxima numa coroação, e o fato dela, na praticidade dela, ao invés de cartucho, ter distribuído amarradinhos meia dúzia de balas... Uma pobreza frente aos cartuchos da Maria Boleira. Nunca me conformei com aquilo.

O segundo trauma descrevo aqui. Eu era sempre convidada a fazer o menino Jesus nos quadros vivos. Era a única criança da cidade com olho azul e cabelo enroladinho e dividia este papel com a Marcia Gallo, cuja mãe conseguia com um lápis, cachinhos melhores que os meus. Éramos sempre os meninos Jesus.

O quadro vivo funcionava como fechamento do evento. Uma vez colocada a coroa, a banda começava a tocar e disparavam os fogos de artifício ao mesmo tempo que uma cortina acima do altar se abria e expunha uma cena bíblica. E lá fui eu com meus 5 anos fazer a criança boazinha, deitada numa caminha, com a filha da Ivone pintora, linda, fazendo o anjo da guarda, de asas super imponentes, a proteger a terna criança em seu sono tranquilo. Assim deveria ser. E bem me explicaram: você fica quietinha deitada na caminha, e depois que abrir a cortina e a banda começar a tocar é pq terminou, então você já pode voltar para colo da sua mãe. Ok, fácil demais, mais fácil que subir nos caixotes pra ter acesso à caminha a partir dos bastidores. 

E assim foi. Deitei na tal caminha, a filha da Ivone maravilhosamente posicionada como anjo enorme a mãe proteger. Posta a palma, colocada a coroa, as flores atiradas, abre-se a cortina e a banda começa a tocar, os fogos a pipocar. Não tive dúvidas. Obedeci de imediato ao roteiro. Levantei, desci e fui pra platéia, para colo da minha mãe. Lá debaixo eu via o lindo anjo a velar a caminha vazia e levei anos pra entender porque o povo tanto ria. E quando entendi, percebi também que a precipitação é uma característica que trago de berço.
Foto:
Arquivo privado de Janice Drumond

domingo, 7 de maio de 2017

O ribeirão Bengo de Caxambu e sua história

O Bengo de Caxambu, em 1868
E a denominação do ribeirão como Bengo é tão velha, quanto a ocupação do local pelos bandeirantes paulistas, que se embrenharam no sertão a procura de ouro e pedras preciosas. Eles foram se fixando ao longo dos caminhos da Estrada Real, plantando suas roças, criando seu gado, aumentando suas famílias e espalhado descendentes por Minas afora.

Bengo é denominação de outro rio, muito maior que o nosso ribeirão e corre na província do mesmo nome, Bengo, no norte de AngolaÁfrica e deságua no oceano Atlântico, onde, em 1670, teve o início do tráfego de escravos pelos portugueses, em direção ao Brasil. Os primeiros povoadores da região mantinham escravos para cuidar da lavoura e trabalhos domésticos. Importaram os escravos e  vieram junto sua cultura, hábitos alimentares, os nomes de lugares e de sua gente.  Bengo é também nome de uma variedade de capim, Braciaria mutica, originária da África, introduzida no Brasil, no ano de 1820, conhecida como capim Angola, que serve para alimentação de animais. Mas ha outros lugares homônimos da palavra Bengo, como um povoado, no município de São João Del Rei e outro localidade na Padre Paraíso. Todos em Minas Gerais. E... o Bengo de Caxambu.

Mas vamos voltar lá atras nos anos em que o ribeirão corria livre pelo vale, e não estava ainda apertado no corpete de cimento que hoje tem.

"O valle ocupado pela povoação de Caxambu tem pouco mais de dous kilometros de comprimento por quinhentos metros de largura e esta a 890 metros acima do nível do mar; o Bengo, afluente do Baependy, corta-o a princípio de leste a oeste, depois de sul a norte, formando um angulo recto; quasi toda a povoação ocupa a margem direita; á esquerda, destaca-se isolado o Morro do Caxambu com um bosque em sua frauda; no sopé o parque com as fontes virtuosas..." (1)
A foto do ribeirão Bengo acima é a mais antiga conhecida, datada de 1868, publicada, em 1894, no livro Caxambu, do médico Henrique Monat.

Um documento oficial com o nome "Bengo"


E em 9 de julho de 1798, em um histórico documento, (ao alto) aparece o nome  "Bengo", citado no requerimento de Luiz Antonio de Souza Mendes, morador de Baependi, pedindo uma Sesmaria, isto é, terras que ele já cultivava, "onde tem terras e roça" "na paragem chamada Bengo" e onde tinha sua morada. Não foi dito que se tratava de um ribeirão e sim "na paragem", isto é, um lugar. Com o pedido da Sesmaria, queria ele na verdade a regulamentação da posse da terra,  para torna-la legalmente o seu sesmeiro, pois como esta no documento "não tem Título Régio", isto é, não era legalizado oficialmente.

Sesmaria era uma porção de terra, dado aqueles que tinham "cabedal", isto é dinheiro, para ocupar e cultivar terras. As terras eram de propriedades do Capitão donatário, que pertenciam a nobreza portuguesa. Eles eram titulares das Capitanias e concediam terras aos sesmeiros. A distribuição das Sesmarias tinha como função incentivar a produção agrícola e se converteu, posteriormente, numa verdadeira política de povoamento da colônia.

Aninha do Bengo

Certidão de nascimento de Anna Leonízia de Castro, 1829, a Aninha do Bengo 
Luiz Antonio tinha como vizinho de porteira o Sargento Mor Antonio José de Castro Medronho, natural de Ouro Preto, e sua esposa Ana de Meireles Freire, que era filha de Dona Magdalena de Meireles Freire, natural de Guaratinguetá e que era proprietária da "Fazenda do Caxambu". Sua filha  Anna Leonízia de Castro  residiu por algum tempo na denominada... Fazenda do Bengo.

O jornal O Baependiano, de 1887, publicado por Amaro Nogueira, neto de terceira geração por parte de mãe de Anna, noticia seu falecimento, referindo-se no texto à antiga moradia  de sua trisavó a "Fazenda do Bengo".

"A finada, como dicémos, residiu a princípio nesta freguesia, na Fazenda do Bengo, cuja situação exata ignoramos, mas que deve ter sido no valle do rio que banha esta povoação e tem o mesmo nome". (2)

De fato, ela era nascida em Caxambu/Baependi batizada, em 25 de dezembro de 1829, na Igreja Mont Serrat (foto). Ana Leonizia de Castro casou-se em primeira núpcias com o Sargento Mor Manoel Dias Ferraz e de segundas núpcias, em Baependi, com Antonio Dias Ferraz, vindo a falecer, em Cristina, em 1887, onde tinha criado sua família. Curiosamente, era conhecida,  na ainda povoação das Águas Virtuosas de Caxambu por... "Aninha do Bengo". Todos as pessoas acima citadas podemos dizer que foram os primeiros povoadores de Caxambu e região.

O Bengo e a origem das fontes


O ribeirão  esta também  relacionado a fatos da descoberta das fontes de água mineral. Um outro neto de Anna Leonísia, assinado como JG, no jornal carioca Correio da Manhã, de 1959, relata as memórias de sua avó. Um de seus escravos chamado Felicio, ao pescar no rio Bengo, viu uma água "que borbulhava com gases, saindo em borbotões", e a provando apresentava um  gosto incomum acre. Segundo ele essa informação é anterior ao ano de 1791. Mais de dois séculos se passaram e as informações que não podem ser desprezadas, foram transmitidas oralmente na família. Esta aí mais uma versão do descobrimento das fontes de Caxambu.

Henrique Monat e suas previsões para o Bengo

O ribeirão Bengo faz parte da bacia do Rio Verde, junto com os rios  Baependi, Taboão  e João Pedro que banham o município. Nos seus primórdios corria livremente pelo terreno, onde hoje é o parque, em direção à Baependi, até que foram descobertas as fontes e foi dado início ao processo de drenagem do lugar, para a captação das águas, e claro, começaram os problemas. Assim predestina Henrique Monat:


"Causa lastima o estado do Bengo. Ao entrar na povoação, elle mede apenas de oitenta a cento e vinte centímetros de largura e as aguas deslizam-se com certa velocidade; canalizado-o, a Camara deu-lhes três, quatro metros e em alguns lugares mais, em toda a extensão da povoação; deixando-a o Bengo, volta à largura primitiva, descreve curvas, rápidas e zig-zags, atravessando extensos capinzais; forma charcos, lagoas, e estreita-se de novo, antes de desaguar no Baependy, com um volume insignificante." E conclui: A situação do Bengo esta a indicar que para elle devem convergir os esgotos da cidade.

Com as várias intervenções, drenagens e aterros, para captação das fontes sem planejamento adequado, o Bengo era motivo de preocupação, quando chegava a época das chuvas. Não precisamos descrever o dramático quadro: Coletores de esgotos obstruídos, águas estagnadas, que invadiam o parque inundando as fontes, lixo e sujeira espalhados por toda a parte. E a área do parque era a "mais bem aterrada de Caxambu", escreveu Monat "... no resto da povoação não se tomaram as precauções mais elementares; mas a Camara consente que se vá construindo, sem se lembrar dos perigos que acarreta tal imprudência, não só sob o ponto de vista hygiênico, como também quando à resistência do solo." O velho problema do crescimento  urbano desordenado, tudo sem planejamento...

Enfim...


E para o bem dos caxambuenses, em primeira linha e turistas, a paisagem foi sendo modificada.  Na administração do prefeito  Camilo Soares (1912-1916)  o Bengo foi canalizado, pelo menos a parte que corria no centro, levando-o para 1.800 metros da povoação. Bem, não era muito. O ribeirão continuaria correndo como ha séculos, agora como cloaca da cidade, quando foi definitivamente iniciado seu segundo grande processo de canalização, no inicio da década 1980, com a construção da "Avenida Beira Bengo". Ok, uma vez mais empurraram os limites de sua canalização para mais de um quilometro do centro da cidade...

É sujo, é limpo

Janice Drumond em suas memórias ajuda-nos a descrever o nosso ribeirão, na década de 1960, quando éramos vizinhas, na rua Quintino Bocaiúva. O Bengo corrida no fundo dos quintais de vó Gervásia, da casa de meu pai José Ayres e ia passar correndo pelo quintal da tia-avó Mariquinha, e do vo Ramiro, onde moram até hoje os seus descendentes da Família/Ayres/Rodrigues Freitas. Nas palavras de Janice, foi  cumprido o destino que Henrique Monat tinha profeticamente predestinado a ele. (leia aqui outras histórias de Janice Drumond)

"A pracinha quadrada, cortada perpendicular pelo Bengo, ribeirão sempre discutido - É sujo, é limpo - como ser sujo se vem direto do Parque, se vem do lago, suprido pelo veio d`águas-régias vindo do bosque? Tá certo que depois de correr a cidade, lá no final perto da fazenda Santa Terezinha, na pontinha que dá no Matadouro já está sujo. A gente sabia disso porque tomava bronca sempre que tentava atravessar a pé, nos fundos dos quintais, inclusive da avó Juruva *(vó Gervásia). Quando mais distante do parque, mais sujo."

Do Bengo que sonhamos, rodeado de árvores, correndo livre, sem ser contido por muros, contorcendo-se na várzea ao pé do morro... Sonho. Da romântica foto de Haroldo Kennedy, no interior do Parque das Águas para a realidade: As obras de sua canalização e os resultados.


Para onde foram as galinhas d`água?

Mas a história canalização do Bengo ainda não terminou! Depois de tantos anos correndo como cloaca da cidade, temos uma boa notícia: O esgoto vai direto  para a estação de tratamento. Aproximadamente 95% do material é tratado.  Mas o pobre ribeirão continua correndo desolado, sem nenhuma vegetação ciliar que o acompanhe até a estação de tratamento e que o proteja do assoreamento. Sem vida, assim pelado não  ha possibilidade de abrigar aves aquáticas às suas margens, como as galinhas d`agua que vi quando criança.

Citações:
*Janice Drumond  quiz dizer Vó Gervásia, pois quando pequena não conseguia pronunciar o nome, e sempre a chamava de "vó Juruva".
* vários grifos meus
Fonte:
(1) Henrique Monat, Caxambu
(2) O Baependiano, 1883
Correio da manhã, 1859
Familie Search
Arquivo Público Mineiro
ARSAE-MG Agencia Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais do ano de 2015.
Fotos:
Arquivo privado
Parque das Águas: Fotos Antigas de Caxambu
Fotos da colagem: Prefeitura de Caxambu
Revista Fon Fon
Jornal O Boemio
Agradecimentos:
 Haroldo Kennedy que emprestou sua bela foto do Bengo, para o Blog da Família Ayres.

sábado, 6 de maio de 2017

A Evolução/Há evolução?


O Blog da Família Ayres esta ajudando vocês a refrescarem a memória. Por incrível que pareça a pendenga de quem administra as águas minerais da cidade de Caxambu é antiga. Aqui duas matérias da Revista semanal de política, direito e literatura, de Baependi chamada A Evolução, que tinha como redator o Dr. João Coelho Gomes Ribeiro, publicadas em... 1890. Caxambu naquela época ainda estava sob jurisdição da vizinha Baependi. Perguntamos: Há evolução?






Fonte: 
Revista A Evolução, 1890