sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Piracicaba, onde tudo começou...

A caminho de Piracicaba, ao fundo a Serra da Careta
Piracicaba é o lugarejo citado inúmeras vezes nos nossos textos. Talvez para a maioria, Piracicaba não existe no mapa, ou desconhecem onde fica. Eu mesma não sabia, até ler os registros antigos e me surpreender. Este pequeno lugarejo, hoje bairro de Baependi, tem uma enorme importância na reconstrução da história dos nossos antepassados. Em suas redondezas nasçeram, viveram e criaram os seus filhos que hoje seus descendentes estão espalhados por este mundo afora.
Ah, então vamos conhecer Piracicaba.

Como todos os povoados, vilas e cidades do antigo sistema Colonial, que sugiram de aglomerados em torno de capelas e igrejas erguidos pelos padres, Piracicaba não foge a regra. Em 1770 ela foi erguida "por provisao" no mes de fevereiro e os registro dizem que em 1776 ela tinha capelão.  E capela já vai para mais de 240 anos!

Batizado realizado na Capela do Piracicaba de 1803 

O texto que se segue foi baseado em outro texto da comunidade da Serra do Papagaio.
Localizada a 25 km de Baependi e a 12 km dos limites do Parque Estadual da Serra do Papagaio, Piracicaba tem como vizinhas as comunidades do Chapéu, Fundão, Gamarra de Baixo, Gamarra de Cima e Juju.

Segundo a história contada pelos seus antigos moradores, Piracicaba surgiu quando um rico senhor de nome Gabriel Ribeiro e seu irmão Antonio Ribeiro chegaram ao local fugidos de São Paulo. Conta-se que motivo da fuga fora um assassinado cometido por Antonio e por isso resolveram ir para o interior das Minas Gerais, escapando da pena de ser condenado. Gabriel comprou a maior parte das terras, onde hoje se localiza o bairro, e posteriormente fez doação à igreja. Sendo assim no local a Ordem dos Jesuítas ergueu a capela e Gabriel, como mostra na assinatura de uma prestação de contas do ano de 1872, como o seu "zelador".


Capela de Santo Antonio do Piracicaba , ao alto seu sino
E Antonio, por uma promessa a Santo Antonio, seu homônimo e padroeiro do lugar, teria feito uma doação para aquisição de um sino de bronze, se ele não fosse condenado. Bem, "se não fosse condenado". Que história! Como poderia ser ele julgado se fugiu para Piracicaba? Ah, essa é outra história. De qualquer modo até hoje seus moradores julgam ter o melhor sino da região, tão bom quanto o da igreja matriz de Baependi.

"Muito povo"

E lá pelas dez e meia da manhã do dia 8 de outubro, de 1882, aconteceu  a benção do sino da Capela de Santo Antonio do Piracicaba na presença de Gabriela Maria Ribeiro, de Gabriel Alvares Ribeiro e Miguel Francisco Ribeiro, prováveis parentes e... "muito povo" assim descrito pelo Reverendo  Marcos Antonio Gomes Nogueira, que dirigiu as cerimônias.  Certamente estavam presentes muitos dos nossos antepassados nesta cerimônia, pois foi um grande acontecimento público para o povoado de Piracicaba. Surpreendenmente achei por um acaso o documento que vocês podem ler no original abaixo, em anexo.


Benção do Sino
Aos oito de outubro de mil oitocentos e oitenta e dois, na  Capela de Sto Antonio do Piracicaba, e presença de Miguel Francisco Ribeiro e de D. Gabriella Maria de Jesus e muito povo, pelas dez e meia horas da manhã, sob a invocação do Glorioso Thaumaturgo Santo Antonio de Lisboa, benzi o sino maior que serve na mesma Capella; de que para constar faço este assento que assigno. 
Vdo Marcos Pereira Gomes Nogueira.

E mais, pesquisando no Jornal "O Baependiano" na edição 126, página 3, na ata da Seção de 12 de dezembro de 1879 encontrei a prova real da doação para as obras feitas por Gabriel Alves Ribeiro à Igreja de Piracicaba. (leia abaixo)

Jornal "O Baependiano" de 1879 
Algum tempo depois o pároco local, sem o conhecimento e autorização dos membros de sua paróquia, repartiu  e vendeu os pedaços de terra, e assim formou-se o bairro de Piracicaba.O nome do povoado foi dado pelos padres, que quando não estavam fazendo seu trabalho de pregação, gostavam de pescar. Mas o peixe só vinha até aqui eles diziam: “-Aqui o peixe caba”. Juntando as duas palavras ficou "pira" se "caba", ou Piracicaba.
A comunidade de Piracicaba vive de artesanato de palha e bambú, além de pequena produção de leite e queijos. O local é marcado por festividades religiosas, como a folia de Reis que começa no seis de janeiro se extendem ao longo dos três primeiros meses do ano. Ha prática de reza terços que acontece em São Gonçalo como também a festa do Padroeiro do Bairro o Santo Antônio, considerado como o Santo casamenteiro, comemorado no dia 13 de junho.

De professor primário a cascavéis

Jornal "O Baependiano"
Ah, algumas curiosidades! Na edição de 16 de fevereiro e 20 maio  do ano de 1879, Piracicaba e o Bairro do Chapeo foi notícia no histórico jornal  O Baependyano, (anúncio ao lado) demonstrando sua importância na região, na seção Gazetilha, com as seguintes notícias:

As cobras
"Durante a primeira capina de uma roça de 8 alqueires pertencentes aos Srs Gabriel Ribeiro e Miguel Francisco Ribeiro no bairro Piracicaba desta freguesia os trabalhadores encontraram 57 cobras que felizmente foram todas mortas! Desta uma era coral, 3 jararacussus, e as outras pertencentes a terrível raça das cascavéis."

Lembrem-se que Gabriel Ribeiro do anúncio ao lado foi quem fez a doação para compra do sino da igreja! Neste anúncio pode-se ler também a referência à  necessidade  de limpeza e capina das bordas das estradas em direção ao bairro Chapeo e Lagoinha próximos à Piracicaba.

O professor

"Do expediente do governo Provincial, do 4 do corrente consta que foi aprovada a nomeação que conferiu o digno inspetor literário desta Comarca ao cidadão Antonio Ignacio de Melo e Souza para reger interinamente a cadeira d`instrução primária do districto de Piracicaba."

Pronto! Agora vocês já conhecem um pouco mais Piracicaba, com professor primário e... sem cobras.
Em março de 2013 Fatima Ayres, Rosária Aires e eu fizemos uma visita à Capela de Piracicaba e deixamos nossas orações aos nossos antepassados.

Relação com a Familia Ayres: Gabriel Alvez ou Alvares Ribeiro foi pai de Gabriella Alves Ribeiro. que se casou com  Francisco Theodoro de Lima filho de João   José de Lima e Silva, este último meu avo de terceiro grau.

Foto: Solange Ayres
Foto do painel de fundo do Blog: Amauri Soares Moreira

Abaixo um importante mapa das comunidades freqüentes citadas no nosso blog, como Piracicaba, Chapeu, Baependi, Aiuruoca, Serra da Careta, Alagoa...

Para não  se perder





quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Rufino

Ah! Me veio à memória!
Morro do Chapéu
Depois que Rufino de Lima e Silva  nasceu as coisas não iam bem. As minas de ouro se esgotavam pouco a pouco e ouvia-se falar em abolição. Por azar faleceram dois dos escravos de seu pai, um de gripe forte no mês de maio de 1874 e Francisco, outro escravo, em janeiro de 1875. E faltando poucos meses para o seu casamento, outra infelicidade: falece seu pai João José de Souza Limao "seu João". Como então tocar a lavoura de tabaco sem eles? Rufino desde criança fazia sua parte e ajudava no que podia, mesmo sendo o filho mais novo da família. Então aos treze anos ele perde sua querida mãe  Joana Thereza Ribeiro de Lima, a dona Thereza como era chamada. Desconsolado ficara seu pai viúvo.

Mas a vida lá na roça ia seguindo o seu caminho. Rufino aos 21 anos enamorou-se Rita Carolina de Castro, que também tinha nascido e foi criada na Lagoa ou Alagoa, como era chamado o povoado originado em torno da Capela de Nossa Senhora do Rosário da Alagoa da Aiuruoca, próximo ao Morro do Chapéu; e assim o casamento já estava sendo arranjado. A união foi realizada num dos dias mais frios do ano. As geadas castigaram os cafezais e foram tão intensas, que chegaram a ser notícia no jornal O Baependyano

No dia 26 mês de julho, uma segunda feira do ano de 1875 as serras amanheceram encobertas por uma densa neblina, que parecia escorrer pelos campos, extendendo até o fundo dos vales, indo bater à porta da casa. Os noivos partiram cedo à cavalo, contornaram o Morro do Chapéu em  direção ao povoado do Piracicaba, que ficava a quase légua e meia da fazenda.
Certidão de casamento de Rufino com Ritta Carolina do ano 1875

O casamento foi realizado na  Capela do Santo Antonio do Piracicaba, abençoada pelo reverendo Marcos Pereira Gomes. Terminada a cerimonia, à porta da Capelinha, Rufino foi mais uma vez abraçado pelos seus padrinhos de casamento o "seu" José Florêncio Bernardes e Francisco Antonio de Souza que reiteraram os votos de felicidades ao casal.

Depois que os participantes se dispersaram, Rufino, por um curto momento, sentiu ainda que era menino e ao contemplar o rasgo de azul do céu, que prometia um dia ensolarado, lembrou de seu pai, que havia partido no janeiro último, quando e as chuvas quentes enchiam os rios e transformavam os pastos em um denso tapete verde escuro de capim gordura.

Onze anos mais tarde ele voltaria à  Piracicaba, não mais para celebrar a vida, mas sim para enterrar o seu filho mais novo que falecera em seus braços aos 11 anos de idade.
Assim foi.

Relação de parentesco: Rufino era tio avô de José Ayres de Lima, o Trançador, (Ele era irmão da mãe de José Ayres de Lima a dona Maria Ribeiro de Lima Ayres).


domingo, 24 de novembro de 2013

Escola de Samba Trançador em cima da hora







Quem diria!
Escrafunchando os meus arquivos de fotos, (re)descobri duas preciosidades: duas fotos de dois carnavais em que eu, neta de Trançador, desfilei na escola de samba que levou o seu nome, "Escola de Samba Trançador em cima da hora", organizada pelo agente cultural e morador do bairro, Marquinhos.



O primeiro registro à esquerda ao alto foi do desfile carnavalesco realizado em 1977 em uma... uma..."escandalosa" foto para a época, eu me equilibrando dentro de uma cachoeira tomando banho de biquini, puxada por uma motorcicleta. A segunda foto à direita foi do desfile realizado no ano de 1978, eu de porta bandeira juntamente com o meu primo Alexandre, filho do tio Samuel. 
Ah, o tempo passa minha gente!

Fotos: Minininho, o fotógrafo

A origem do nome do Bairro Trançador

Contando e recontando a história



José Ayres de Souza Lima (1873-1943), este era o verdadeiro nome de Zé Trançador, que morava no alto da colina, à direita do Morro Caxambu, onde também era propretário de terras que se extendiam até a divisa com a Comarca de  Conceição do Rio Verde.

Ele era conhecido por sua habilidade de confeccionar artefatos de couro, assim como o seu pai, José Fernandes Ayres, (1835-1897) que no século XVIII também era  apelidado de Trançador e que também exercia o ofício de trançar relhos e confeccionar  artefatos de couro para cavalos. A tradição da profissão passou de pai para filho e assim o local ficou conhecido pelo nome de seus dois moradores artezãos, José Ayres de Souza Lima e seu pai, José Fernandes Ayres como Bairro do Trançador.

Num tempo dos Tropeiros, em que todo o transporte era feito por burros ou em carroças puxados por cavalos, produtos como arreios, selas, relhos de couro eram  artigos de primeira necessidade.


Ah, voltando ao seu Zé Trançador, digo, a José Ayres de Souza Lima (foto),  ele juntou dinheiro com seu negócio de couros, comprou um pequeno pedaço de terra, onde é hoje o final da Rua Policarpio Viotti com a avenida Ápio Cardoso, casou-se Gervásia Maria da Conceição (foto), a “Sá Gervásia” e fez família. Da união nasceram 10 filhos e depois deles um mundão  de gente, os netos, bisnetos, trisnetos, tataranetos, festejando a vida. 




Foto: Solange Ayres
Micro ônibus para o Bairro Trançador na Estação Rodoviária de Caxambu
Foto acima, remasterizada em 2020.

Virgolina Balbina de Lima, uma pequena biografia


Hoje resolvi contar a história de dona Virgolina Balbina de Lima. Mas quem era essa senhora para ter importância assim na história da Família Ayres, perguntariam vocês. Pois bem, Virgolina Balbina de Lima foi, junto com José Ignacio de Lima e Silva padrinhos de batismo de Sabina Maria da Conceição  mãe de Gervásia Maria da Conceição  assim como outro irmão de vó Gervásia, Josino. Atravez dessa interessante figura, freqüente presença nas certidões de batismo, pode-se dizer que foi uma importante pessoa, digamos uma matricarca, que tinha inúmeros afilhados e afilhadas, afilhados estes que compunham um núcleo familiar do qual participou  Justiniana Maria da Conceição, sua filha Sabina, ambas como escravas e Gervásia, liberta, nossa, tataravó, trisavó, bisavó e avó. O perfil da família de Virgolina forneceu muitas e importantes informações acerca da situação, familiar, sócio-econômica, cultural dos nossos antepassados, já que elas viveram no seio deste, digamos, "clã" familiar.

Virgolina morou no Chapeo, hoje bairro a 12 km de Baependi. A vida social da nossa protagonista era regida pelos acontecimentos religiosos em torno da nossa conhecida Capelinha do Santo Antonio do Piracicaba ,que temos ao fundo como foto do nosso blog. Ela foi madrinha de 21 crianças entre vizinhos, conhecidos, parentes, escravos e filhos de escravos. Nesta capela foram abençoados os casamentos, aconteciam os batismos e também foram encomendadas as almas dos que morreram; e no cemitério ao lado  tiveram o seu último lugar de descanso.

Voltemos à Virgolina. Atualizando o texto em 14/06 de 2015 por ter encontrado novas informações sobre a nossa biografada; ela era filha de João José de Lima e Silva (1798-1859), o avo de José Ayres de Lima (1873-1943) que tinha apelido de  "Trancador". Os seus pais vieram de Pouso Alto, onde ele tinha lavoura e moraram, segundo o sensu de 1839, no Quarteirão 2, Fogo 17 em Pouso Alto. Aos  16 anos se casou Francisco Bernardino de Faria de 26 anos, em 13 de setembro de 1849 na Capela do Santo Antonio do Piracicaba (foto abaixo à direita) e foram morar no Chapeo. Os padrinhos, João Theodoro Correia e o Alferes Antonio Rodrigues da Cunha Silveria. Concluímos que se o padrinho de casamento foi um "Alferes", então pode-se dizer que o casal era de família de alguma posse, para ter a honra de serem apadrinhados por um oficial que exercia alguma autoridade local.
C ertidão de casamento de Virgolina Balbina de Lima

Da união nasceram 10 filhos: Por ordem:
Bernardino Lopes de Faria (1853- ?), nascido e batizado até agora em lugar desconhecido;
O restante da prole foi batizada na Capelinha de Santo Antonio do Piracicaba: Com exceção de Luciana de Faria, nascida em 1856, que nasceu na Alagoa, na época pertencente à Aiuruoca e que não consta no quadro acima, Lodgelo de Faria,  (1859-?), Lucinda de Faria, (1861-?), Eleeser de Faria, (1862-?), José de Faria, (1864-?), Arminda de Faria, (1867-?), Sabina de Faria, (1867-?), Bruno de Faria, (1872-?), De Faria, (-1875) este falecido bem pequeno e Juvencio de Faria, (1877-?).
Capela de Santo Antonio do Piracicaba

Mas não somente estes pequenos detalhes colhidos das certidões de batismo, casamento e óbito contam um pouco da situação econômica da família. Francisco Bernardino, seu esposo, possuía escravos, que constam neste vasto registro de nascimento, vida e morte. Em 13 janeiro do ano de 1874 sua escrava Rosa, pariu Vitória, sendo ele mesmo o padrinho de batismo. Tristemente, dois anos depois tiveram que sepultar a pequena com apenas 2 anos de idade.
Virgolina faleceu em data desconhecida, até agora.

Casamento consangüíneo

Por ironias do destino, se nossas suposições estiverem certas, de tia Célia Araujo e minha, houve casamento consangüíneo, isto é, união  entre parentes na Família Ayres. Gervávia era BISNETA de João José de Lima e Silva  que se casou com o NETO dele.

Para entender:
Joao José de Lima e Silva casou-se com Joana Thereza Ribeiro de Lima
-Filha: Maria Ribeiro de Lima casou-se com  José Fernandes Ayres/Silva
 - Neto: José Ayres de Souza Lima  

-  Filha: Virgolina Balbina de Lima de Joao José de Lima e Silva casou-se com Francisco Bernardino/Lopes de Faria
 -  Neto: Bernardino Lopes de Faria, união fora do casamento, com Sabina Maria da Conceição, mãe de Gervásia.
 -  Bisneta: Gervásia Maria da Conceição casou-se com José Ayres de Souza Lima.

Da família: Virgolina Balbina de Lima foi madrinha de batismo de Sabina Maria da Conceição, mãe de Gervásia Maria da Conceição. Ela é  avó "torta" de Gervásia por parte de pai.

Nota: O texto foi alterado  14/06/2015 em função de novas informações  coletadas.


domingo, 10 de novembro de 2013

Quem procura, acha.

E se algo mudou nos últimos 30 anos foi a revolução no mundo virtual e  aqui mesmo neste mundo virtual, pude pesquisar os arquivos da Igreja que continham informações de batismo, matrimônio e óbitos que iam para atras no tempo, precisamente no ano de 1700, quando o Brasil  tropeçava nos seus próprios passos, dando início à colonização das Capitanias Hereditárias e escrevendo por tortas linhas a triste história da escravidão. Isto era o Brasil.

Lendo os arquivos, apesar de curtos textos informativos sobre datas, locais e pessoas, obtém-se muitas informações, principalmente podemos lê-las nas entrelinhas. E que entrelinhas! Se uma criança nasceu “natural”, era porque não tinha pai declarado, ou conhecido, como é o caso de vó Gervásia e bisavó Sabina.
Se hoje em dia, este fato não é hoje revelante, naqueles tempos era vergonha da família e a pessoa carregava a pecha até os seus últimos dias de vida. Se a anotação vinha “filho legítimo”, ele tinha pai e mãe seu status na sociedade. Havia também o filho “exposto”, que significava ou que foi abandonado pelos pais, ou de pais ignorados. Quanto mais antigo os arquivos, mais se encontra “expostos”, isto é, crianças abandonadas.

O vivo arquivo dos mortos

Entretanto o mais interessante dos arquivos pesquisados foi e é o arquivo dos óbitos, ou dos mortos. Lá o escrivão, no caso o padre, fazia as últimas e derradeiras anotações sobre o defunto, seja ele criança, muitas delas! ou adultos. Aqui temos um verdadeiro retrato do passado do Brasil Colonial, das diferenças sociais, da triste vida que levava os seus cidadãos e os considerados “não cidadãos”, os negros escravos.
No início dos anos de 1900 a mortalidade infantil pode ser contada. Tristes estatísticas.
Morria-se “sem assistência” de pneumonia, meningite, gripe, sarampo, tétano no umbigo, escrito como “mal do umbigo”, coqueluche, como “catarro sufocante”, “bexigas” ou varíola, difteria, tifo, cólera, sarna (sic) e males do intestino citados como “diarréia“, “vermes intestinais” ou… “ataque de bichas”.
Certidão de óbito de João de 1901
Talvez por isso a minha tia avó, Maria Ayres de Lima, a Mariinha, irmã do meu avô  José Ayres de Souza Lima,  casada com Francisco Thomé da Silva em 1898 perdeu seus 5 filhos, Antonio, João, José, Otávio e Francisca que vieram ao mundo entre 1898 e 1906, faleceram pouco depois de nascidos. Antonio de bronquite, Francisca de febre intestinal, o pequeno João de poucas semanas de sífilis (foto), José de cólicas intestinais e Otávio (foto) de… sarna. O destino dessas crianças não foi diferente de tantas outras…

Certidão de óbito de Octavio de 1906
Tuberculose era o “mal do século” e ceifou muitas vidas nas tristes paragens do Santo Antonio do Piracicaba povoado da região de Baependi e na chamada “Águas Virtuosas de Caxambu”(Caxambu ainda pertencia à Comarca de Baependi e somente ganhou autonomia administrativa em 1901). Quando não se sabia exatamente a causa-mortes, assentava-se “síncope cardíaca”, “ataque do coração” ou “lesão cardíaca”. Algumas doenças nos arquivos mais antigos tinham outras denominações. Assim arteriosclerose ou “incômodo das faculdades mentais” ou “marasmo senil” foi a causa mortis aos 84 anos de idade o proprietário de escravos José Ferreira Simões, em 1919, “dono” de minha bisavó Sabina Maria da Conceição (1865- ?).

O trabalho foi quase de detetive. Assim que achava um nome ele era ponto de partida para outra procura, pois as certidões, em sua maioria contém nome dos pais ou cônjuges. Até o presente colecionei na árvore genealógica da Família Ayres cerca de 900 pessoas, cuja maioria não esta mais entre nós.

Texto: Solange Ayres, Kreuzau, Alemanha, 2013.


Porque?


Porque resolvi escrever um blog da Família Ayres

Depois de um ano de trabalho na pequisa da origem de nossos familiares, não posso conter a vontade de comunicar a todos os resultados, mesmo que parciais da pesquisa realizada.
A motivação para de tanto trabalho foi ocasional. O que era fato e o que era verdade o que falavam de nossos antepassados? O que ouvi na infância, depois de adulta quis eu saber e ir a fundo nas verdades. Que conversas eram aquelas? O fato é que o Seu Joaquim Roque, presente em minha infância, aliás exímio confeccionador de cercas de bambu, contava que minha vó Gervásia era filha de escrava e foi quase pega no laço para se casar com o meu avô, conhecido como Zé Trançador. Ele, Seu Joaquim Roque sabia das coisas, pois conheceu Sabina a minha bisavó das roças de Baependi e acompanhou de perto a história de nossa família.

A Fátima e a Rosária sugeriram que eu escrevesse um livro. Boa idéia, mas porque não publicar aquí na internet e usar esta maravilhosa máquina computador para dar a conhecer as novas gerações tanta história? E mais, ter orgulho dela, pois só quem sabe de onde veio sabe para onde vai.

Pois, em nome da verdade histórica, eu como historiadora, resolvi ir a fundo nos fatos, fatos que apresentarei aqui para toda a família.

Solange Ayres