domingo, 8 de agosto de 2021

O desabafo/Carta da princesa Izabel ao Conselheiro Francisco de Paula Mayrink/ Assunto: Igreja Santa Isabel da Hungria de Caxambu

Princesa Isabel e o Príncipe Pedro
 

O Blog publica aqui na íntegra a carta da princesa Isabel, endereçada a conselheiro Mayrink sobre as razões de sua mágoa com a construção da Igreja Santa Isabel da Hungria. Teria mesmo Isabel feito a promessa de construir um templo devido sua suposta infertilidade? Na carta não há nenhuma alusão quanto à promessa de construir a igreja, através do uso das águas de Caxambu. 

Boulogne-Sur-Seine, 28 de maio de 1895.

Ilmo. Sr Conselheiro Francisco de Paula Mayrink:


Recebi a missiva do fiel amigo, comunicando-me que resolveu concluir à sua própria custa as obras do templo há tantos anos paradas do "Morro da Cruz", em Caxambu. Foi esse templo, como se sabe, iniciado sob meus auspícios e denominado, na ocasião, pelo povo mineiro, Santa Isabel, não só por honrosa deferência à minha pessoa como por ter coincidido a primeira visita que fiz ao local como o dia consagrado pela Igreja Romana à Santa húngara de quem tenho o nome.

Julgava que nada mais existisse desse templo, pois a última informação que tive foi a de que iam demolir a por há tanto construída, para a edificação de uma casa de caridade. Daí a surpresa que me causou sua carta. Sensibilizou-me a idéia de fazer o amigo os pagamentos das obras em meu nome para dar aos caxambuenses a impressão de quem sou eu quem termina a construção do prédio. Assim procedendo, quer como disse, além de agradar aos locais, prestar-me também a mim, um serviço, evitando que me apodem de perjura os que proclamam ainda, em Caxambu, haver eu feito uma promessa sem a ter cumprido. Não quer que na empresa apareça o seu nome!... Jamais vi igual desprendimento às vaidades do mundo! Confesso que, como meu pai, tenho pelo seu espírito de generosidade e renúncia particular admiração. Não nos esquecemos, p. ex., de quando, sem esperar recompensar, quando já não tínhamos o poder, prestou aos meus um favor que lhe custou dissabores e algumas indiretas represálias por parte do Governo Provisório.

Foi quanto, na tardes de 17 de novembro de 1889, no mesmo dia em que embarcamos para o exílio na canhoneira "Paraíba", fez-nos baldear para o navio "Alagoas" de sua frota, na Ilha Grande, litoral fluminense, por saber do desconforto e insegurança que nos oferecia o barco que, para conduzir-nos à Europa, nos pusera a disposição o novo governo.

Renovo, pois, muito comovida, os meus agradecimentos pela intenção que o levou a pretender fazer os pagamentos da construção da Igreja de Santa Isabel, em meu nome.

Seria, insisto, a generosidade, que lhe é, aliás, peculiar, o móvel único desse ato. Sim, porque não aparecendo no negócio o seu nome, nem sequer o reconhecimento público da obra receberá o senhor. Agradeço-lhe o sacrifício, mas não quero que a Igreja, que se propõe ressuscitar, seja a mesma que imaginei e apadrinhei na juventude. Deve ser outra. A primeira poderia com razão ser considerada obra minha, mas esta não: é sua, legitimamente sua. Faça , pois os pagamentos em seu próprio nome e de-lhe, outro título. Não é por orgulho que o peço, Sr Conselheiro, mas porque jurei não contribuir com mais um ceitil para a construção, desde que, ao chegar em 1873 ao Rio de Janeiro a notícia do desaparecimento misterioso do dinheiro depositado em conta bancária para aquele fim, começaram os adversários do Império atribuir o fato a uma ação desonesta de meu esposo. Responsabilizaram assim tacitamente o Príncipe pela paralização dos trabalhos. As calúnias como sabe, contra ele no setor de negócios, sucediam-se irritantemente, desde o término da Guerra do Paraguai. Visaram talvez com isso encobrir a lembrança do seu heroísmo, já que voltaram de lá - para quem queria ver honestamente os fatos - como um dos principais contribuintes de nossa vitória. Não podendo, para empanar-lhe o brilho, atacá-lo por nenhum outro lado, faziam-no maldosamente por esse. No caso de Caxambu, possuía ele, felizmente recibo da importância (vultosa para a época) que em meu nome entregara para a construção. Reproduziu em 1874, a meu conselho, esse importante documento de defesa em vários jornais, e o senhor mesmo o deve ter visto. Solidária como Príncipe em face aos acontecimentos, resolvi, depois do nascimento do nosso primogênito, não mais interessar por aquele templo. Os amigos de Caxambu, que estavam a par das minhas justas mágoas, bem como os que criam a versão da promessa, escreviam-me sempre, esperando pacientes, anos a fio, que me decidisse a enviar mais dinheiro para o término das obras. Faziam-no não que julgassem impossível conseguir de outro modo o auxílio. Pelo contrário: ser-lhes-ia isso facílimo através das autoridades civis, do clero, de capitalistas generosos, ou ainda do povo por subscrição. Mas não lhes convinha dessa maneira... Convinha-lhes apenas que a Igreja fosse inteiramente obra minha. E isso pelo meu título, e não propriamente pela minha pessoa. Havia também inimigos que rezavam para que eu, magoada, desistisse definitivamente de tudo e a Igreja viesse em consequência a tomar outro nome. Foram estes os vencedores. Ao invés de lhe proporcionar tal prazer, quisera de coração atender aos poucos e verdadeiros amigos. Mas atendendo-os estaria, é obvio, vilipendiando meu marido.

Não se importe, sr. Conselheiro, com esta decisão. A república venceu, e aí mesmo em Caxambu, que é uma ínfima partícula na nação brasileira, encontrará o senhor muita gente ao seu lado, essa mesma cujo interesse e apagar de vez as últimas reminiscências do regime deposto. Muitos, creia, o louvarão por verem que partiu do senhor espontaneamente a resolução de mudar a invocação da igreja. Se, contudo, para defender-se de injúrias, achar ser preciso (o que julgo improvável) publicar esta carta, tem, desde já, para tanto, o meu consentimento. Minha comoção diante da generosidade e modéstia de seu gesto em querer completar as obras em meu nome, gastando em tal empresa somas que poderiam mais tarde fazer grave falta na sua família, proporcionou-me, na fase de recolhimento e tristes em que ainda me encontro, um oportunidade providencial de desafogo, a qual se reflete nesta tão longa missiva. Bem sabe que é contra meus hábitos expandir-me assim. Talvez esteja, pela extensão e o teor da epístola, ferindo igualmente as conveniências da nobreza. Costumo, no entanto, em casos especiais como este os da consciência e do coração.

Sensibilizou-me, repito, sr. Conselheiro a intenção generosa do seu gesto, que me ensejou esta oportunidade inesperada a benfazeja de desopressão.

Com que mágoa evoco as cenas narradas num diário do Rio por Jacques Ourique, ocorridas em 15 de novembro de 89 em casa de Deodoro, quando aquele que, na expectativa ha atual de algum benefício, antes vezes beijara a mão de meu pai, atendia sorridente a massa desordenada e delirante que ali fora homenageá-lo, depredando, alcoolizada talvez, as insígnias da monarquia. É, pois de esperar que, à exceção dos bairristas de Caxambu, que desejam seja eu a executora das obras, o povo brasileiro se alegre com a resolução que julgo dignamente tomar. Creio na alegria do povo pelo antagonismo (sincero ou interessado) que vem (ao que leio) em sua maioria, ultimamente manifestando pelas coisas do Império. Assim, para que a Igreja que o senhor, tão bem intencionado, se propõe terminar, não seja nem possa parecer a mesma que só recordações muito tristes me traz, suplico-lhe diga ao povo a verdade, dando à Igreja ao mesmo tempo outro nome. Sei bem que sente ao ler esta súplica, mas não se preocupe - Caxambu, estancia que tanto ama e pela qual tanto tem feito, nada perderá... Santa Isabel de Hungria tampouco, pois vou iniciar brevemente outro templo sob sua invocação em Serqueux, norte da Franca, para cuja inauguração será convidado. Não morro, esteja certo, sem dar, eu a mesma, a santa de minha devoção de menina o templo que, com tanta fé, ideei em Caxambu

Recomendações minha e do Príncipe a D. Clara.
Renovando ainda minha súplica e meus agradecimentos, sou sua como sempre, muito afeiçoada.


(ass.) Isabel, Condessa d`Eu

Caxambu Grifos meus
Foto: 
Arquivo Museu Imperial de Petrópolis
Fonte:
Lessa, Francisco de Paula Mayrink, in Vida e Obra do Conselheiro Mayrink (Completada por uma Genealogia da Família), Pongetti. 
Agradecimentos:
Pedro Henrique Ribeiro, historiador, colaborador do Blog da Família Ayres.

A construção da Igreja de Santa Isabel da Hungria/desvio de dinheiro e uma princesa indignada

 





Os 126 degraus que nos levam ao alto do morro, onde foi construída a igreja de Santa Isabel de Santa Isabel da Hungria, foram escalados muitas vezes na minha infância e adolescência. Era o calvário, dizia minha mãe, e assim se parecida com aqueles intermináveis degraus, um rito anual que cumpriu por muito tempo nos Sábados de Aleluia, quando ia assistir à missa, às 6 horas da manhã, levando lírios brancos que floresciam no nosso jardim.

A história da construção da igreja Santa Isabel da Hungria se inicia com a visita da princesa Isabel à localidade. Casada em 1864 e até a data de sua visita à povoação, em 1868, Isabel teria tido dificuldades de gerar filhos, e a corte então veio para experimentar um tratamento nas Águas Virtuosas de Caxambu. 

A povoação e já tinha fama de possuir fontes que curavam desde que os leprosos foram expulsos, em 1843, quando um juiz mandou incendiar suas choupanas. Ironicamente,  eles foram os maiores propagadores da fama das "águas virtuosas". Bem, bem, da pobreza para a realeza. Sete anos depois da visita real, em 15 de outubro de 1875, nasce o primogênito, Pedro de Alcântara, resultando a consolidação da promessa: construir um templo em  gratidão e devoção. Assim foi e é contada a história. Verdade? Hum...

Na ocasião foi instalada uma cruz no alto do morro, marcando o local da construção da futura igreja. Caxambu era Vila Nossa Senhora dos Remédios e estava subordinada, administrativamente, à vizinha Baependi. Até aqui, eu desconhecia a existência de uma biografia do neto de Conselheiro Mayrink, Francisco de Paula Mayrink Lessa, o capítulo "Caxambu", contém muitas informações de bastidores da construção do tempo, inclusive uma correspondência entre o Conselheiro e a Sua Alteza real, a princesa Isabel. Mayrink foi o benfeitor que conseguiu terminar o templo quase 26 anos depois de lançada sua pedra fundamental. Mas vamos lá aos acontecimentos.

Cronologia da construção:
A visita de S. A. Real, princesa Izabel
 
A chegada da realeza se deu no dia 17 de novembro de1868, uma terceira-feira. A comitiva ficou hospedada no palacete de Carlos Theodoro Bustamante. Entre os políticos locais que recepcionaram a princesa, estavam Polycarpo Viotti, dr. Paulo Ferreira, o capitão João Carlos .

No dia 22 do mesmo mês, em solenidade na Câmara Municipal de Baependi, foi lavrada a ata do lançamento da pedra fundamental para a edificação da igreja. A pedra foi benzida pelo reverendo monsenhor Luiz Pereira Gonçalves de Araujo, para posteriormente ser colocada pela princesa no local da construção do alicerce da igreja. Na ocasião S. A. Real ouviu pedidos para que removesse o cruzeiro do lugar onde se achava, plantado por Francisco Viotti, em 3 de maio de 1862, o que foi deixado a cargo do engenheiro Christiano Luz. 

A princesa fez um depósito "considerável" de 50:000$000. O gasto, ou o "abono" quantia para construir a igreja, seria superior à da igreja de Petrópolis, onde residia a Família Real. Sim, superior, pois a igreja de Petrópolis era simples em comparação com o plano da igreja em estilo neogótico em moda. Na ocasião de sua estada, abriu subscrição para os voluntários fazerem seus donativos que somaram 4.000$000, assim noticiado em O Baependiano.

Para realização da grande empreitada, foi escolhida uma comissão local composta pelo coronel Justo Maciel, o  vigário Marcos Nogueira, o comentador Mattos, dr. Viotti e o capitão João Carlos. Já havia  uma comissão da qual faziam parte o coronel Francisco Werneck, o conselheiro Ribeiro da Luz e o Visconde de Mesquita. 

Matriz insignificante X Igreja no estilo gótico

Mas qual! Relembrando, do lançamento da pedra fundamental até o início de sua construção arrastaram-se anos. No início do mês de dezembro de 1884, a comissão das obras da igreja deveria se reunir, afim de fazer a marcação exata no "Morro do Cruzeiro", para qual veio o deputado provincial Christiano Luz, um dos membros da comissão. Mas devido ao baixo comparecimento, a reunião foi transferida para o início de janeiro de 1885. No planejamento estava a abertura da  rua que ligaria  a praça da igreja até o alto do morro.

Assim noticiava o Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro, em 1885 : "A matriz é insignificante; mas começa a abrir os alicerces para uma linda igreja gótica, Santa Isabel de Hungria, cuja planta vimos, e que depois de concluída ficara um primor de architectura, sendo que era situada em posição muito pitoresca. Era orçada em 130:000$, havendo já levantados 90:000$ aos esforços da Princesa Imperial, que tem pedido esmolas para essa construção. Estamos convencidos de que Caxambu melhorará muito com a edificação dessa igreja; tem visos de paradoxo esta affirmacao nesta época, mas precisa notar que estamos em Minas, província essencialmente católica."

Água X água benta 

Em maio de 1885 eram concluídos o nivelamento do local onde seria edificada a igreja. A construção  estava todo vapor e carroças de pedras já estavam sendo conduzidas ao alto da colina, noticiava O Baependiano e as obras "estavam em grande adiantamento" e que a igreja teria um  jardim de "grandes dimensões" ao redor. E como toda obra é obra, os trabalhos foram paralisados e no ano de 1886, foram retomados, "a custo de perder o que ja tinha sido feito", segundo noticiava o mesmo jornal.

Como não havia separação do Estado e Igreja, as instituições religiosas recebiam dinheiro, muito dinheiro em comparação as outras tantas necessidades das pobres comunidades. Em 1887, foi encaminhado o pedido, e aceito, à Assembleia Provincial, através do deputado Américo de Matos, de consignar uma cota de 6.000$000 para a igreja Santa Izabel. Mattos apelava para o "fervoroso espírito religioso" dos parlamentes, muitos deles religiosos. No mesmo orçamento, a presidência autorizou despender 10$000 para conservação da estrada do Picu, hoje Itamonti, apresentado por Domingos Viotti. Não era muito se compararmos ao orçamento para uma capela sozinha, mas a lista das igrejas que recebiam dinheiro era muito mais longa que as de criação de escolas, manutenção das estradas, abastecimento de água, que ficavam para o segundo plano. A voz de alguns deputados soava baixa, quando citavam que não se esquecessem de dar algumas cotas, principalmente para o abastecimento de água potável. Água potável versus água benta, uma difícil disputa em tempos de Brasil Imperial.

Igreja Nossa Senhora dos Remédios X Igreja Santa Izabel da Hungria, a concorrência

Registro do livro Caxambu de Henrique Monat, 1894.

As obras da apela de Santa Isabel, eram  notícia no Jornal do Comércio, em setembro de 1891. O jornal reportada a construção de outra capela, com invocação da padroeira Nossa Senhora dos Remédios, onde estava construída a capelinha, cujas alfaias eram cuidavas o pelo comerciante e benemérito da povoação Costa Guedes. As duas obras concorreram entre si. No ano de 1886, o orçamento provincial de Minas Gerais previa para a igreja Nossa Senhora dos Remédios  200$000. A discussão era se não seria melhor concentrar os esforços em construir a igreja Santa Isabel, e já que ela era tão boa, cederia  o altar mor para a padroeira, indo ocupar os dois altares laterais. Para a capela Nossa Senhora dos Remédios já havia  15:000$000 acumulados! A proposta, claro, não iria vingar nunca. Uma era a obra do pároco local, outra um desejo de Sua Majestade, a princesa Isabel. Então pelo sim e pelo não, os dois templos foram sendo erguidos.

Além do abono da princesa, uma verba foi liberada pela a câmara  dos deputados. Isso, verba pública para construção de um tempo religioso. Outros donativos engordaram a conta, saídos dos bolsos do sr Mialasky, 10$000 e ajudaram a totalizar 21.000$000.

Parece que a obra teve muitas mãos. Em diferentes ocasiões estiveram na povoação o dr Manoel Valadão Junior, engenheiro residente na Campanha, substituindo dr. Christiano. Noticiava O Baependiano que o  sr Tavares, auxiliar de engenharia, ficou hospedado na povoação por dois meses para trabalhar na obra. Mas as obras não terminavam e já haviam se passados quase duas décadas...

Duas promessas

Entre as cerimonias de lançamento da pedra fundamental e  desejo de construir a igreja passaram-se mais de vinte anos, e sua inauguração, se deu apenas quando a Família Imperial estava no exílio. Depois de as obras se arrastarem por mais de 26 anos foi na administração do conselheiro Mayrink, um banqueiro rico e benemérito da povoação e que teve a concessão de explorar as águas minerais, que o projeto  foi retomado. O concessionário das fontes foi quem levou a diante o projeto, numa segunda promessa, quando quebrou uma perna fraturada ao cair de um cavalo. Se voltasse a cavalgar, prometeu concluir o templo. De acordo com vesões não confirmadas, a lei 398 em 2 setembro de 1904, isentou o bispado de Pouso Alegre do imposto de transmissão da propriedade que deveria pagar, ao legalizar a "doação feita por Francisco de Paula Mayrink de uma Igreja em Caxambu". (1) Nenhuma confirmação foi encontrada em sua biografia.

Ricardo Honorato Pereira de Carvalho, o engenheiro

A igreja Santa Isabel da Hungria,  estilo neogótico, comum na Idade Média foi projetada pelo engenheiro Ricardo Honorato Pereira de Carvalho (1855-1906), um carioca, nascido em Magé, conhecido por Ricardo de Carvalho. Ricardo se mudou para a hidrópolis em 1890 para trabalhar como gerente da Empresa da Águas. Ele era o homem de confiança de conselheiro Mayrink. Além da igreja, foi responsável pelo encanamento de água para o Grande Hotel Palace, hoje Palace Hotel, de Caxambu. Ricardo de Carvalho era empregado público da Secretaria de Agricultura, na diretoria de obra como desenhista. Na década de 1890, trabalhou em Caxambu, na administração do conselheiro Mayrink, sendo candidato a vereador da câmara Municipal de Baependi, em 1884, quando  ocupava o cargo de diretor da Empresa de Águas Minerais de Caxambu. Ele também foi responsável pelo o encanamento para as águas do Grande Hotel, atual Palace Hotel. Em 1896, assinava como gerente da Empresa de Águas de Caxambu. Carvalho foi quem inventou uma máquina de extrair gás carbônico das águas minerais e engarrafá-las com pressão do mesmo gás. A parafernália foi instalada junto a fonte D. Pedro em agosto de 1896.

O engenheiro foi também organizador do livro intitulado Guia do Viajante, sobre Caxambu, em 1899, além de benemérito  da Sociedade Recreativa Club Caxambuense, isso mesmo, o CRAC, aquele clube que tinha uma linda sede no centro da cidade e que depois se transformou em um supermercado. A solenidade foi realizada no dia 4 de dezembro de 1934, em sua  memória. Tudo isso ficamos sabendo pelo Pesquisador Pedro Henrique Rodrigues Ribeiro, que achou o Blog da Família Ayres e nos forneceu as informações.

Nenhum centil! Nenhum centavo!
Desvio de dinheiro/ Isabel indignada se recusa a dar dinheiro para a construção da igreja

Na verdade, o conselheiro Mayrink interveio na tentativa de terminar a obra, quando soube que a construção inacabada e abandonada ia ser posta abaixo. Sim, a obra estava parada ha 26 anos! 

Mayrink viajou em 1894 é o bispado de Mariana e indagou ao presidente da Camara qual o destino que eles queriam dar à construção paralisada. Paulo Seixas pretendia levantar lá um nosocômio. Não se assustem. Nosocômio é sinônimo de hospital. Isso, iam colocar abaixo o templo em construção e edificar em seu lugar um hospital. De fato, foi construído um hospital, mas em 1926, ao lado, a Casa de Caridade Sao Vicente de Paulo, coordenado pelo padre de bronze, João de Deus.

Mayrink se propôs a terminar a obra, e, para isso, adquiriu as terras do entorno do templo, parte do morro de Caxambu. Com o plano de continuar a obra, escreve Mayrink uma carta a princesa Izabel, em 1895, quando a Família Real se encontrava no exílio, em Boulogne-sur-Seine.

Na correspondência, esclareceu a princesa que já no ano de 1873, de volta ao Rio de Janeiro depois de suas viagens pela província, teve conhecimento que o dinheiro depositado para a construção do  templo tinha desaparecido e indignada disse que não despenderia nenhum centavo a mais para as obras.

Assim respondeu Isabel:

Boulogne-sur-Seine, 28 de maio de 1895.

Ilmo. Sr. Conselheiro Francisco de Paula Mayrink:
Recebi a missiva do fiel amigo, comunicando-me que resolveu concluir à sua própria custa as obras do templo há anos paradas do "Morro da Cruz" em Caxambu. Foi esse templo, como se sabe, iniciado sob meus auspícios e denominado na ocasião, pelo povo mineiro Santa Isabel, não só por honrosa deferência à minha pessoa como ter coincidido a primeira visita que fiz ao local com o dia consagrado pela Igreja Romana à Santa húngara de quem tenho o nome.
         Julgara que nada mais existisse desse templo, pois a última informação que tive foi a de que iam demolir a parte há tanto construída, para a edificação de uma casa de caridade. Daí a surpresa que me causou sua carta. Sensibilizou-me a idéia de fazer o amigo os pagamentos das obras em meu nome para dar aos Caxambuenses a impressão que sou eu quem termina a construção do prédio. Assim procedendo, quer como disse, além de agradar aos locais, prestar-me, também a mim, um serviço, evitando que me apodem de perjura os que proclamam ainda, em Caxambu, haver eu feito uma promessa sem a ter cumprido.
            ... Seria, insisto, a generosidade, que lhe é, aliás, peculiar, o movél único desse ato. Sim porque não aparecendo no negócio o seu nome, nem sequer o reconhecimento público da obra, recebera o senhor. Agradeço-lhe o sacrifico, mas não quero que a Igreja, que se propõe ressuscitar, seja a mesma que imaginei e apadrinhei na juventude. Deve ser outra. A primeira poderia com razão ser considerada obra minha, mas esta não: é sua, legitimamente sua. Faça, pois, os pagamentos em seu próprio nome e de-lhe, outro título. Não é por orgulho que o peco, Sr. Conselheiro, mas porque jurei não contribuir com mais um ceitil para a construção, desde que, ao chegar em 1873 ao Rio de Janeiro a notícia do desaparecimento misterioso do dinheiro depositado em conta bancária para aquele fim, começaram os adversários do Império a atribuir o fato a uma ação desonesta do meu esposo. Responsabilizaram assim tacitamente o Principe pela paralização dos trabalhos.
              ... No caso de Caxambu, possui ele felizmente, recibo da importância (vultosa para a época) quem em meu nome entregara para a construção.
                ... Solidaria com o Príncipe em face das acontecimentos, resolvi, depois do nascimento do nosso primogênito, não mais me interessar por aquele templo.

            De partida forçada, reitera o Conde D´Eu numa carta datada de 17 de novembro de 1899, endereçada a Joaquim Delfino Ribeiro da Luz, o desejo do prosseguimento as obras da Igreja. A carta foi escrita dois dias após a Proclamação da República, a bordo do navio Parnaíba que levaria a Família Real para a Europa rumo ao exílio.



Igreja Nossa Senhora da Conceição para Igreja Santa Isabel da Hungria.

Por ter Mayrink adquirido o terreno e o entorno se dispondo a terminar a obra, a igreja teve por alguns anos outro nome: Igreja Nossa Senhora da Conceição. Sim, era um projeto dele em sua propriedade, daí a mudança de nome que não agradou a população. 

Isabel, que não queria ter seu nome associado a um projeto que não pode acabar, passou a responsabilidade a Mayrink, pela decepção de ver o dinheiro doado sumir. Assim templo foi renomeado para Igreja Nossa Senhora da Conceição durante as obras finais. Na época escreveram à princesa enviando um abaixo assinado de cerca de 600 pessoas para que ela consentisse que o nome fosse retornado, Santa Isabel da Hungria. A igreja teve portanto, por um curto período, entre 1885 a 1887 o nome de Igreja Nossa Senhora da Conceição. Mayrink, o benfeitor de fato da igreja, manteve-se discreto e a princesa agora ressurgia como a grande benemérita da obra, embora sua finalização se deu por causa do amigo. 

As obras terminaram em abril de 1897. A igreja foi benta, segundo a mãe de Mayrink Lessa, neto do conselheiro Mayrink, em missa celebrada pelo cónego Amador em 12 de junho de 1897. A igreja, segundo ela estava "cheia e linda". E não duvidamos. Presentes estavam quase toda a família Mayrink, marquesa de Itamaraty e outras pessoas de vulto da comunidade religiosa, política e financeira. Segundo ela, os hotéis ficaram lotados.  A controvérsia da missa realizada ter sido num templo "particular", e que se chamava Nossa Senhora da Conceição e que estava na propriedade de Mayrink, e por isso não constar nos arquivos diocesanos e sim que o templo foi "benzido" em 19 de novembro, assim oficializado sua existência como templo.

Inaugurada a igreja, protestaram dois parlamentares republicanos. Um telegrama recebido da povoação de Caxambu, constava que o conselheiro Mayrink, banqueiro, empresário e político, eleito deputado da província em1889, teria construído a igreja. Na verdade eles alegam que Mayrink se ofereceu para concluir e não que a obra tenha sido toda dele, acusando-o de "apavonar", isto é, se transformar em um pavão e dizer que a igreja teria sido feito seu. Podemos concluir que foi injusta acusação dos parlamentares em dizer que Mayrink queria projeção política ao terminar o templo por sua própria conta. Que a justiça seja feita. Mayrink salvou a igreja da ruína.

Patrimônio histórico / Onde estão os santos?

Enquanto Conselheiro Mayrink esteve em Caxambu, a igreja era, segundo o neto Mayrink Lessa, bem cuidada. Em 1913 o vigário da paroquia fez uma inspeção na capela e constatou que ali faltavam vários ornamentos religiosos da alvenaria, utensílios e muitos santos, assim como seus nichos laterais e púlpitos. Em visita em 1970, Mayrink Lessa confirmou o desolado estado da capela. Do relatório do vigário, só restavam a imagem de madeira de Santa Isabel. Segundo as freiras Irma Delfina e Marcelina,  dos santos primitivos, procedentes da Europa, foram pouco a pouco transferidos sem nenhum controle para igrejas de outras cidades mineiras, consideradas "mais evoluídas". Assim foi contada a história.

Fonte:
A Província de Minas, 1887
Lessa, Francisco de Paula Mayrink, in Vida e obra do Conselheiro Mayirink, 1975, Pongetti.

Agradecimentos:
Pedro Henrique Rodrigues Ribeiro atualmente cursando o 7° período de Direito na Universidade Cândido Mendes. Historiador nas horas vagas, pianista nas horas amargas e pianista nas noites caladas. 

Como sempre, a Júlio Jeha.