segunda-feira, 27 de junho de 2016

José Fernandes Ayres de Lima, meu bisavô era um tropeiro



E sentem novamente que lá vem história! Paciência, gente! Hoje vamos contar a história do velho José Fernandes Ayreso Trancador-pai, que deu origem ao nome do Bairro Trançador, situado na barra do Morro de Caxambu. Esta parte da história  esta sendo resgatada em entrevistas sensacionais de Maria das Graças Pereira, a Graça, em visita  ao primo Sylvio Ayres de Lima, neto de José Fernandes, filho de Anna Ayres de Lima, a tia/ avó Lica e José Eugenio de Souza, em São  José dos Campos. Uma verdadeira jóia de documentação agora de posse do Blog de nossas Famílias, Ayres/Freitas/Pereira. Publicaremos tudo, mas tudo mesmo. Com vocês a história de nossos antepassados...

Os caminhos do sertão 

Vamos então lá para as Minas Gerais no século 18...
Pois Minas desempenhou papéu importantíssimo no abastecimento de gêneros alimentícios para as áreas urbanas nos tempos do Brasil Colônia. Os produtos viajavam de longe. Um dos impulsionadores deste fato foi a chegada da família real ao Brasil, fugida da invasão de Napoleão Bonaparte, que causou enorme impacto, transformando a economia da então Capitania de Minas.

A população cresceu e a demanda por gêneros alimentícios  para os centros urbanos, como Vila Rica, hoje Ouro Preto e o Rio de Janeiro dinamizou o comércio.
Em 1802  passaram pelo Registro oficial da Mantiqueira, para se ter uma idéia, 716 porcos rumo à capital. Três anos depois, com a transferencia da corte portuguesa, em 1811 os números foram de 1.632. Entre 1818 e 1891 os porcos exportados já eram 30 mil, uma considerada soma. No mesmo percurso da Estrada Real passavam os produtos que o povo necessitava: aguardente de cana, rapadura, café, arroz, feijão, farinha de mandioca, milho, trigo, azeite de mamona, cera, sabão, estribos e selas, chicotes, chapéus de lã, algodão em rama e tecido além de outros animais, como galinhas, carneiros, patos. E também doces como a marmelada e o famoso queijo mineiro já viajavam Brasil afora.

De fato a transferencia da Corte portuguesa para o Rio acabou impulsionando a economia mineira compensando o declínio da atividade mineradora. Como os historiadores costumam escrever, Minas não entrou em crise, simplesmente houve uma diversificação econômica.
Os alimentos produzidos em Minas cruzaram fronteiras, chegando a São Paulo e ao interior do Rio de Janeiro. E com a expansão cafeeira no Vale do Paraíba fluminense houve uma verdadeira integração dos três Estados, com a ajuda dos trilhos de ferro.

Trilhas, tropeiros, Trançador  e as "traias"

Rancho Grande (dos Tropeiros) quadro de Benedito Calixto
de 1921, Santos, São  Paulo
Neste tempo de transformações existiu um grupo  particular para a produção e comercialização de alimentos: os tropeiros. O nome derivado de "tropa", aplicado aos próprios donos dos animais, quase sempre fazendeiros e criadores que formavam um grupo de peões, cada um com sua especialidade: os tocadores, tangedores, o madrinheiro, menino que seguia à frente do dianteiro, na mula, montando uma égua mansa, e guiando a tropa ao som de cincerros nela pendurados, que também era encarregado de preparar o café e a comida, feijão de tropeiro, pirão de mandioca, carne de porco, carne seca, toucinho, farinha de milho. A caravana podia se arrastar, dias, semanas até meses seguidos sob a poeira, sol e chuva. Em suas horas de descanso, eram trocadas as informações que adquiriam no caminho, transformando-se em preciosos interlocutores, transportadores de informações de lá pra de cá e de cá pra lá.

"Mais do que simplesmente transportar mercadorias, as tropas criam toda uma cadeia de negócios mantida por redes familiares. O que inclui a mercadoria fundamental para o funcionamento daquela economia: os escravos. As mesmas tropas que levavam das Minas para o Rio os gêneros de subsistência subiam de volta a serra transportando negros escravos.

O tropeiro é um elemento de transição e ligação entre o universo rural, ligado à produção, e o urbano, base do comércio. A um só tempo proprietário de terras, produtor rural, comerciante de alimentos e traficante de escravos, ele logo se torna importante figura política na região. A abertura de novos caminhos ligando Minas ao Rio, entre 1810 e 1820, atende às suas demandas. É o caso das estradas do Comércio e da Polícia, construídas quase simultaneamente, e da estrada do Picú, hoje Itamonte, financiada pelos próprios fazendeiros de Campanha, Baependi e Pouso Alegre, que abreviou em cinco dias o caminho das tropas para a Corte, no Rio de Janeiro. Na arena política, os tropeiros conquistam cargos de deputado e senador, levando sua agenda para o centro das discussões governamentais e impulsionando de vez as relações econômicas entre os estados do Sudeste."*

Estas transformações foram sentidas em toda a Província e o mercado consumidor interno foi a chave para o sucesso para o desenvolvimento do país.

O Trançador  e as "traias"   

Indumentária de um tropeiro, não faltando
 os laços,relhos e bolsas de couro
Quem não ouviu falar em "traias"? Traia para nós em Minas são bagagens de viagens. Pois a palavra vem de lá, "tralha". Todo tropeiro tinha sua "traia", ou suas "traias", aqui abreviado dito como em Minas, isto é, laços, rédeas, trançados para domar os animais, utensílios de cozinha que eram transportados consigo durante as viagens.

Em torno dessa grande economia, surgiram as novas profissões: o peão domador, o ferrador, o toureiro, o rancheiro e o aveitar, um veterinário primitivo e... O trançador .

E foi na profissão de artesão para essa "economia tropeira" que nosso bisavô, e também Tropeiro, José Fernandes Ayres fez o seu nome.

Na fralda do Morro Caxambu, na propriedade em que vivia, tinha sua casa, na beira da estrada mesmo. Próximo ao terreno o lugar se tornou um acampamento rústico, onde as tropas faziam o seu "pouso", um ponto de passagem e parada, vindos de Conceição do Rio Verde em direção à Baependi. Era  um pedaço descampado de terra onde acampavam ciganos, índios, brancos e negros, escravos e libertos, gente de toda raça e dolência...



Maria de Lurdes de Deus, bisneta de José Fernandes Ayres, o Trançador-pai,
fotografada por Maria das Graças Pereira indicando
 onde localizava as terras pertencentes ao seu bisavô, ao pé do morro,
onde hoje é o Bairro do Trançador, Caxambu
É, era bem ali no alto, onde é hoje o Bairro Trançador  que José Fernandes morava e que adquiriu esse nome por ser ele o artesão de peças de couro, laços, relhos que trançava com maestria, vendidos aos tropeiros que circulavam em toda a Província de Minas.  Seu filho José Ayres de Lima, casado com a minha avó Gervásia Ayres de Lima, o meu avo, não somente herdou do pai a habilidade de trançar relhos, mas também o apelido de  Trançador.

Em visitas a um neto de José Fernandes de Lima, Sylvio Aires de Lima, relata para o Blog da Família Ayres suas memórias e conta...



Levavam bois nas classes noturnas

Mas o tropeirismo estava com dias contados. Com a chegada dos trilhos de ferro em 1884, e a inauguração do trecho Minas-Rio, tudo que era transportado por terra, a pé, no lombo dos burros, e os próprios bois, perderam o seu lugar e agora a carga ia de trem e depois em caminhões.

E o "O Baependiano noticiava em abril de 1883:

É o dia 12 deste mês em que pela vez primeira o carro do progresso transpos as mais do nosso município, e o cavalo dinâmico que come o carvão, vomita chamas e devora o espaço, depois de haver saciado a sede nas águas do Atlantico, pisou ofegante o solo baependiano, em seu caminhar delirante, para o Far West brasileiro, à procura dos tesouros minerais e vegetais, que naquela misteriosa região só esperam a mão do homem para colhe-los."

Na década de 1930 o tropeirismo viveu os seus derradeiros dias. Por causa de sua importância para a história econômica do Brasil, os Tropeiros ganharam o seu dia, dia 26 de outubro.



O poeta   bem descreveu em "Soledade de Minas":

Em outros tempos as máquinas de ferro
Cruzavam seus chifres e queimavam os cascos
Na agulha grossa dos dormentes.
As caldeiras ferviam nas locomotivas
E o vapor tecia sonhos de guerra
no peito dos soldados.
As cidades ferroviárias estavam no apogeu.
Levavam bois nas classes noturnas,
Esparramavam óleo no joelho dos vagões,
E faziam o ofício de mulheres-cortesãs,
Fiando suéteres para a História Industrial.
Havia cabelos esvoaçantes, náuseas,
E na dobra do morro o olhar da lua
Comia a cauda agitada dos trens.
Havia pasmo das crianças 
Perante a violencia das invenções inglesas
Nas gargantas úmidas de Minas*
Ao vivo e a cores

E para aqueles que querem ver ao vivo como era o trabalho de nossos antepassados, de como a profissão de Trançador era exercida, façam uma visita.


Agradecimentos:
O Blog da Família Ayres agradece a aqueles que possibilitaram o contato com os demais membros da Família Ayres de Lima em São José dos Campos que ouviram e responderam! as perguntas de nossa pesquisadora, Maria das Graças Pereira e ao seu marido Vanderlei de Moura Silveira, que muitas vezes serviu de arquivo, memorizando o conteúdo das conversas, bem como de motorista da entrevistadora.

Foto: Vidal Araujo, montado em sua mula na Festa de Tropeiro em Tropeirismo e a formação  do Brasil
Poesia: Eustaquio Gorgonne
Fonte:
Alexandre Mendes Cunha é professor do Departamento de Economia e pesquisador do Cedeplar, ambos na UFMG. Autor da tese de doutorado em História “Minas Gerais, da capitania à província: elites políticas e a administração da fazenda em um espaço em transformação” (UFF, 2007).
O Baependiano
Video: Gravado na residencia de Sylvio Aires de Lima, em São  José dos Campos, por Maria das Graças Pereira em junho de 2016.

5 comentários:

  1. Olá Solange, tudo bem? Sou Breno Booz e faço parte do ramo genealógico Aires (não sei se é o mesmo que o seu)! É o único site de genealogia que encontro da família Aires de Minas. Queria saber se seu Bisavô José Fernandes Aires, o trançador pai, teve algum filho, com o sobrenome Aires, casado com alguma Maria Felismina. Estou num empecilho muito grande com minha genealogia a muito tempo, pois o avô materno da minha avó chamada Lurdes Maria Aires, não consta em sua certidão. Queria saber muito de onde ela herdou o "Aires". Somos de uma cidadezinha no interior, Belo Vale, e a família dela viveu na zona rural chamada Laranjeiras. Espero que possa me ajudar! Desde já agradeço.

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    1. Breno, eu precisaria de mais detalhes.José Fernandes Ayres não teve filha chamada Filismina. Temos todas as certidões dos filhos deles. Outra, talvez ela pertence a um ramo da família, que se mudou para outra parte de Minas Gerais. Precisaria de mais informações para melhor pesquisar sobre a Felismina. Qual e o nome dela completo?

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    1. Desgraca pela Jacob. Já pensamos muitas vezes em publicar um livro. Esta sendo feito levantamentos para tal. Vamos ver se sai.

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  3. Sou José Carlos Ayres filho de Severino Ayres. Pai natural de Campina Grande PB. Eu nasci em Araras algum parente meu por aí????

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