sexta-feira, 27 de maio de 2016

Caxambu, o maior potencial hidromineral do planeta



Este parque e estas águas fazem parte da história das 
Famílias Ayres e 
A todos os nossos antepassados e descendentes as nossas melhores
 lembranças deste planeta água.
Preservar é preciso.

terça-feira, 24 de maio de 2016

João de Deus, 40 anos dedicados às águas milagrosas


Carteira de trabalho de João  de Deus de 1927
A primeira surpresa que um documento nos trouxe: Na carteira de trabalho o nome do pai de João  de Deus "Manoel Fernandes". Ha muito o sobrenome "Fernandes" tinha desaparecido dos sobrenomes registrados da família e ao depararmos com a carteira de trabalho de nosso biografado, emoção pura: Ele de fato existiu! Assim como o nome do pai, José Fernandes Ayres, o Trançador-pai, às vezes nos registros assinado "Silva" e que também que desapareceu dos registros. Era comum ao gosto dos que faziam as anotações tanto eclesiais, cartórios ou escrivães escrever o que lhes era ditado , não raro com vocábulos diferentes. Mas não importa. Hoje vamos recuperar a história pessoal de João  de Deus.

Monsenhor José  João de Deus



Não, não,  o nosso João não  era religioso nem Monsenhor! José João de Deus (?-1946) foi o primeiro pároco da cidade de Caxambu empossado em 1 de janeiro de 1906, fundador da Santa de Caridade São  Vicente de Paulo, a Santa Casa, em 1926  e foi quem inspirou o pai a dar o nome ao batizado. Então José João de Deus batizou João de Deus. Bom lembrar que o Monsenhor celebrou ainda nas famílias Ayres e Rodrigues Freitas outros batismos, casamentos e assinou certidão  de óbito  de outros nossos familiares.

Os pais e os pais adotivos

Bem, o nosso João de Deus era filho de Manoel Fernandes de Lima e Elisa/Candida de Jesus, nascido em 8 de março de 1902 e batizado em 5 de abril pelos padrinhos Bonifácio José da Silva e... Thereza Constestina Soler, aqui a primeira esposa de Salvador Soler, que depois de viúvo, casou-se novamente com Mercedes Lima/Soler, filha de Gervásia Maria Ayres e José Ayres de Lima, o Trançador-filho.

João ficou órfão de pai e mãe muito cedo. Primeiro falece sua mãe em conseqüência de uma lesão cardíaca, e dois anos mais tarde perde também o seu pai, que faleceu em 25 de abril de 1908, às 5 horas da tarde, provavelmente doente a dias, pois chegou a ser "confessado e encomendado" por Monsenhor José João de Deus.

Na data  em que seus pais faleceram ele e suas irmãs eram ainda muito pequenos. Maria Elisa (1897-?), com 9 anos, João  de Deus (1902-1991) com 4 e Sebastiana de Lima (1904-1957) com 2 anos.  A solução foi a solidariedade da Família Ramiro de Freitas e da tia Mariquinha  que acabou acolhendo o pequeno João. O fato é que João  cresceu na família do "onde come um, come... 12, ele era o número 12°. O destino de suas duas outras irmãs ainda esta para ser pesquisado.

Piadinhas ácidas

Então descobri quem foi o autor das "piadinhas ácidas". Em conversas com tia Célia, a nossa biblioteca familiar, fazendo pesquisas sobre a vó Mariquinha e sua família, relatou ela que sempre via o tio Ramiro passar na rua com tábuas provenientes do engarrafamento, que a Empresa doava para os funcionários para serem utilizadas como lenha e que o passante contava de quando em vez umas "piadinhas ácidas".  Na verdade a tia acreditava que o passante fosse o tio Ramiro até descobrirmos que era João  de Deus, o sobrinho adotado por vó Mariquinha. Ah, o quão ácidas  eram as piadinhas eu não cheguei a perguntar...

Os avós e bisavós

Os seus bisavós pelo lado paterno, João  José de Lima e Silva e Joanna Thereza de Lima, achados num documento inédito, abaixo, vieram procedentes da cidade de Pouso Alto, onde foram cadastrados no sensu de 1839. De lá eles  se mudaram para a região do Chapeo em Baependi. Sua avó Maria de Souza Lima, que casaria com José Fernandes Ayres, Trancador pai, até esta data não havia nascido.



Em ambos os lados dos antepassados de João  de Deus, segundo relatou Maria Lourdes de Deus, sua filha, eram escravos. Sua avó Elisa era descendente de escravos, pelo lado paterno, nasceu em 1861, quando a escravidão ainda não havia sido abolida. Nesta data também ela não poderia ter sido beneficiada pela pelo lei do Ventre livre do ano de 1871.

Águas Virtuosas

Mas antes prosseguir com a biografia de João de Deus, vamos contar um pouco sobre a cidade e do lugar onde ele trabalhou por mais de 40 anos...

No ano de 1903  Caxambu foi elevada à categoria de cidade de vila, separando-se de Baependi da qual sua administração estava ligada e em 1915 adquiriu seu "status" de cidade. Muitas mudanças ocorreram na cidade, que agora deixava de ser chamada de "Águas Virtuosas", para adquirir sua verdadeira identidade como Estancia de Águas Minerais: Caxambu. Seu nome já havia corrido mundo e ficou mais conhecida pela visita da Princesa Isabel ao local em 1868. Mas muito  antes de ser famosa, antes das águas serem engarrafadas para serem exportadas em caixas de madeira para todo o Brasil, o local onde é hoje  o Parque das Águas era pura lama, um pântano...  

Morféticos, dispépticos, reumáticos, loucos

Todos queriam banhar-se nas "águas milagrosas". O lugar era originalmente um  poço e lá se chegava através de um a picada na mata, onde foram colocados paus no qual se podiam apoiar e colher água, sem se afundar na lama. No local também acudiam os morféticos, dispépticos, reumáticos, papudos, cancerosos, cegos, loucos, loucos! que  se limitavam a beber da água milagrosa; a maior parte banhavam na lama seus membros cobertos de chagas. Com o tempo  morféticos se tornaram numerosos e começaram a afugentar os outros enfermos e em 1840 o juiz municipal ordenou a retirada  dos pobres coitados enxotando-os como  elementos perniciosos acampados na borda do Morro. 
Contam que os lázaros abandonaram o acampamento e  jogaram praga  condenando o lugar. E para afugentar-los definitivamente, atearam fogo nas choupanas, umas 40, e assim o acampamento foi purificado pelas chamas. Tal o trauma causado pelo incidente que somente em 1844 o local voltou a ser procurado. Contraditoriamente eles, os leprosos, contribuiriam para a propagação da qualidade das águas que curaram suas feridas. Agora todos queriam experimentar também o "milagre" e assim ascendeu a curiosidade atraindo doentes na esperança da cura também para seus males. Nasceram as "Águas Milagrosas".


A exploração comercial das águas porém foi iniciada em 1886 com contrato feito entre o governo da Província e particulares. Na época foram feitas várias obras para a captação das águas, bem como melhoramento da infra-estrutura para atender os "aquáticos", isto é a aqueles que faziam suas estações de água, na ainda pertencente à Baependi. De concessão em concessão, em 1904 a exploração e administração denominada Empresa das Águas volta para o Governo estadual.

O casório

João de Deus foi um dos seus trabalhadores e  teve a carteira de trabalho assinada em 10 de março  de 1927 no cargo de "operário", aos 25 anos de idade, ainda solteiro nesta data, com um salário de cinco mil oitocentos e seis cruzeiros. Mas não demorou muito o casamento aconteceu. Em 28 de julho, na agora Igreja Nossa Senhora dos Remédios,  ele se casa com Zilda Morais, tendo como testemunhas do enlace Antonio Bartholomeu Gonçalves e Joaquim Ferreira Leite, casado  com Etelvina Rodrigues Freitas (1898-?), a filha de Maria José de Lima, a Mariquinha.

Certidão de Casamento de João  de Deus e Zilda Moraes
Normalmente os casamentos eram  celebrados nos fins de semanas, mas  a cerimonia que se realizaria às pressas, foi um pedido de seu pai Guilherme, que também era funcionário da Empresa das Águas. Ele estava muito doente e solicitou adiantar a data, apressando o dia do casamento. Monsenhor José João de Deus, o mesmo pároco que fez o seu batismo e que lhe emprestou o nome, teve que acordar no dia muito cedo. A cerimonia foi feita às  às 6:30 numa fria da manhã de uma quarta feira  do mês de  julho de 1927. E quando na rua da Torrefação de Café, o cheiro do grão torrado subiu ao ar e os noivos ainda comiam bolo com os padrinhos de casamento, receberam a notícia de que seu pai havia falecido... Dona Filomena, a sogra, agora viúva foi morar com a nova família.


Da esquerda para direita ao alto: José João, Ana e Julio, abaixo da 
esquerda para direita: Maria de Lurdes, Francisco, Lucília.
Os romeiros 

E passado um ano de seu casamento nasce a 9 de julho de 1928, primeira filha, Maria Elisa, batizada po por Ramiro Rodrigues,  marido de vó Mariquinha em cuja casa ele foi criado. Em 10 de maio de 1930 nasce Alice, em 7 de fevereiro de 1932, José. Depois vieram José João de Deus, (1932-?), Joaquim de Lima,  (?-?) Francisco de Lima, (?-?) Ana de Lima/Morais, (?-?) Manoel de Lima, (?-?) Lucília de Lima, (?-?) Julio de Lima, (?-?) Maria de Lourdes de Deus, (1942-).

A família costumava fazer peregrinações à Aparecida do Norte, no mês de dezembro, quando das comemorações do aniversário da cidade e levar suas preces à nossa Senhora de Aparecida, a santa, cuja imagem apareceu na rede de pescadores no rio Paraíba do Sul, no ano de 1717. Neste dia os lambe-lambe tinham muito trabalho registrando para a eternidade os romeiros e suas famílias naquelas máquinas antigas. Obrigatória era a Basílica Velha, construída no ano de 1888 como paisagem de fundo.

No dia da foto, faltou o pai, João de Deus, pois a família não podia ir toda. É que na época todos tinham suas "a criações", isto é, porcos, galinhas. E como os romeiros saiam sábado e só voltavam na segunda à noite de trem, alguém tinha que ficar para cuidar deles. "Os bichos tinham que cumê ", relatou a filha Lurdes. Então o pai neste ano não saiu na foto e ficou para tratar da... Bicharada.

João  ficou viúvo  em 1947, quando Zilda  faleceu aos 60 anos de um derrame. Mas a solidão não  durou muito tempo  e depois de pouco tempo "ja estava firme"; e como na modernidade, permaneceram morando em casas separadas.


João trabalhou na Empresa das Águas por 30 anos, mas continuou lá ainda por mais 10 anos depois de aposentado. Muitos milhões de garrafas passaram pelo crivo de seus olhos. Ele controlava a máquina que colava os rótulos nas garrafas de diferentes tamanhos. Na baixa temporada ajudava os jardineiros a embelezar o Parque.  Ao todo 40 anos dedicados ao trabalho. João  faleceu em idade avançada, aos 89 anos de problemas cardíacos.
Assim foi.


Fonte: Henrique Monat, Caxambu
IBGE: Caxambu, Engenheiro Virgílio Correia Filho, 1940

Agradecimentos  muito especiais à Maria de Lurdes de Deus, filha de João  de Deus, que nos forneceu preciosas informações para a reconstrução da história da família, bem como os seus "tesouros", fotos e documentos guardados durante décadas que agora serão publicados aqui no Blog da Família Ayres.

sábado, 14 de maio de 2016

O mistério do Quincas e Zé Gaguinho

Anotações de Maria das Graças, 2016 
Ou os difíceis caminhos da pesquisa histórica.

E por caminhos tortuosos da pesquisa das árvores genealógicas...
Infectada pelo vírus Maria das Graças Pereira colocou-se a caminho com uma detetive dos tais personagens perdidos; pesquisa que desde que iniciamos é agora não nos deixa mais dormir direito. Das primeiras averiguações  locais da procedência  dos antepassados da Família Rodrigues de Freitas/ Ayres, nos vimos em um emaranhado de nomes e datas. Como juntar tudo e virar informação confiável? Quem era quem, onde e como? Dificill, muito difícil. Era assim: Na infância tratávamos as pessoas pelos apelidos e hoje sequer poderíamos imaginar ou associar as pessoas à membros das famílias atuais. As sombras do passado estavam muito longínquas quando descobrimos a... Lurdes. Não somente ela esta ajudando a juntar os cacos, literais cacos de informações para montarmos a nossa, a vossa árvore genealógica, em princípio os ramos da Graça , os Rodrigues de Freitas e a minha, os Ayres. 

Em princípio,  as pesquisas não despertam a todos igualmente os mesmos interesses que nos animam, Graca e eu a fazer a pesquisa de nossos antepassados. Portanto dissemos uma para outra: O que nos importa é que nos dá muito prazer o jogo da descoberta, das novas descobertas. Na verdade estamos contando as historias de nossos antepassados, mas também a história do Brasil, dos séculos passados, onde existiu escravidão, dor, alegrias, gente rica, pobre, remediada. Das nossas famílias tem de tudo um pouco. Nossos antepassados viveram um curto período de prosperidade, quando o Brasil ainda era colonial de portugal e o regime escravista era que reinava. La  neste passado que "pregresso" esta a origem de nossas famílias, lá em Pouso Alto, quando Joao José de Lima e Silva casou-se com Joana Thereza e vieram de mudança para o Chapeu, cultivar tabaco, milho e arroz em terras Baependianas. Resgatando as histórias, estamos regatando uma parte de nossas vidas. Ufa!
E se não bastasse a curiosidade, serramos os nervos de alguns de nossos primos, primas, tias sobreviventes ainda neste século 21: Tia Célia e a prima Lurdes, que pacientemente ouvem as nossas perguntas, associam as pessoas nos ajudando a costurar esta imensa colcha de retalhos. A elas a partir de agora dedicamos os nossos "posts".

Zé Gaguinho

Ficamos sabendo que um de nossos antepassados trabalhou como cozinheiro do Palace, ou era mesmo do Hotel Marques, como estava no Jornal da Camara de Caxambu, fazendo uma homenagem a ele, dando até nome de rua e lembrando que seus antepassados deram o nome ao bairro Trancador. Ora, mas não era do "nosso" Trancador que eles falavam? Homenagearam um personagem do qual nós    desconhecíamos? Que grau de parententesco teve ele com a original Família Ayres, do qual possuíamos todas as certidões possíveis para comprovar que do "nosso" lado estaria o "nosso" avo e bisavô Trancador, pai e filho? Longas foram as conversas telefonicas  com a Lurdes, que a CIA provavelmente gravou entre o Brasil e Alemanha. Quem sabe escutaram que a frase "Peraí que vou desligar as panelas" poderia ser um código secreto, ou "Agora to lavando a cozinha". Aí me levanta a Lurdes o nome "Zé Gaguinho". O serviço secreto provalmente estaria de ouvidos em pé. Seria um "codinome"? Não, Zé Gaguinho existiu, confirmado por uma outra informante: Celia Lima, a nossa biblioteca familiar, que do alto de seus quase um século continua lúcida, ativa, crítica, ácida. Sem elas não poderíamos nunca juntar os pedaços  rasgados da nossa história familiar...

E no "message" do Facebook a conversa ia pararela... Meus Deus, achávamos que estavamos ficando loucas, a Graca e eu. Nem dormir direito a gente conseguia, e nem me fala nas plantas que não foram aguadas de lá e de cá, tamanha a euforia e esquecer as pobrezinhas lá secando... Ah, e falando do Quincas.

Rodela do Quincas

Tudo isso porque a Graca se lembrava da história da... "Rodela do Quincas" em Aparecida do Norte, quando a família ia fazer suas preces a Santa achada no rio. Quem era mesmo o Quincas? Que teria ele haver com a família? Era primo? Inventado ou não? Estamos ainda nos perguntando.

Aguardem o desenlace das histórias...
Maria das Graças  Pereira da Silveira
Solange Ayres



sexta-feira, 13 de maio de 2016

Samuel Ayres de Lima, o sobrevivente. De volta à África

Samuel Ayres de Lima, na cerimonia de entrega da medalha
conferidas pela ONU  pela participação do Brasil na missão
 Congo,  Africa, em 4 de junho 19622.
O sobrevivente

 
Monsenhor José Joao de Deus
Samuel Ayres de Lima, nascido a 5 de maio de 1918, filho de José Ayres de Lima, Trancador-filho e Gervásia Maria da Conceição.
Contava ele numa de nossas conversas telefônicas, que tinha nascido muito fraco, raquítico mesmo e por isso sua mãe, não acreditava que iria sobreviver... Não sem razão, vó Gervásia perdeu 6 filhos em 16 vezes que ficou grávida. José, em 1900, de "mal do umbigo", Joaquim, em 1901, do "mal dos recém nascidos", Anna, em 1902, de pneumonia dupla, Maria, em 1905, igualmente falecida de pneumonia dupla e Stella, batizada como Esther, em 1921, de disenteria. Então não havia razões  mesmo para que vó Gervásia acreditasse que Samuel, o filho caçula sobrevisse. Mas sobreviveu!  Esperaram quase um ano para fazer o seu batizado, que foi realizado  em 7  de março de 1919, na Igreja Nossa Senhora dos Remédios, em Caxambu. Foram padrinhos Juscelino Vieira Machado e Maria Vieira Machado, abençoado pelo Monsenhor José João de Deus.




Pelo lado paterno Samuel era neto de 1° grau de José Fernandes Ayres (1835-1897)  ,Trançador-pai e Maria de Souza Lima (1841-1906) e bisneto de João José de Souza Lima (1798-1875) e Joana Thereza Ribeiro de Lima (1806-1860) e constaram do sensu de 1839 (vide abaixo) da cidade de Pouso Alto e que por volta de 1850,  se mudaram para o Chapeo, hoje bairro da cidade de Baependi. Até a esta data a avó de Samuel, Maria de Souza Lima  ainda não  havia nascido.


Alguns registros apontam que a família tinha como vizinhos de porteira a família de  João  Ferreira Simões, (1835-1919), futuro proprietário das escravas Justinianna Maria da Conceição (1843-1914) a Nana como era conhecida e Sabina Maria da Conceição (1865-?), respectivamente bisavó e avó  pelo lado  materno de Samuel e assim as famílias ficaram eternamente entrelaçadas...

Seus ascendentes e descendentes



De lapidador a sargento

Samuel saiu muito cedo para a vida. Sua carreira no mundo do trabalho iniciou aos 14 anos, partindo de Caxambu em ao direção Rio de Janeiro, onde começou a trabalhar  no laboratório de propriedade de um conterrâneo de Cruzília, ligados à família dos Juca Leite. Depois foi trabalhar numa fábrica de lapidação de pedras preciosas. Aos domingos ainda "pegada uma escada colocava nas costas e ia fazer biscates como eletricista", contou a nossa biblioteca familiar, Célia de Lima. Eletricidade era o seu robby e talvez por isso acabou mais tarde se especializando em mecânica de avião. Ele ainda Morava em Cascadura, quando se inscreveu na aeronáutica,  iniciando posteriormente sua carreira militar na Força Aérea Brasileira.

De volta para a África

Samuel Ayres de Lima em contato com a população local no Congo,
 na Missão  de Paz da ONU,
Organização das Nações Unidas, em 1962
E ironias do destino Samuel, ele, neto e bisneto de escravas volta ao continente de origem de seus ancestrais, à África, em missão de paz no Congo, bem próximo de onde partiam os navios negreiros em direção ao Brasil.
Entre os séculos XVI até meados do século XIX vieram cerca de 4 milhões de homens, mulheres e crianças  para o Brasil. A contabilidade não fecha. Os registros foram queimados para que evitassem que eles pudessem pedir indenização posterior. Foram muito mais. Os comerciantes portugueses de escravos vendiam suas "mercadorias" no Brasil. O transporte  era feito nos porões dos navios em condições desumanas. Os que sobreviveram eram vendidos e iam trabalhar nas fazendas de açúcar ou nas minas. As mulheres eram  empregadas no trabalho doméstico. Não sabemos ao certo como a nossa bisavó /trisavó Justinianna chegou ao Brasil. Ela continua sendo a mais antiga ancestral da Família Ayres pelo lado materno de vó Gervásia, nascida por volta de  1843 entre o Brasil e a África.

Mas o que mesmo aconteceu no Congo?

Em 1870 os europeus iniciaram acorrida para lotear a África. Se não bastasse ter tomado os seus filhos como escravos, agora estavam atras dos territórios e suas riquezas minerais.  Muitos interesses estavam em jogo. Enquanto os portugueses achavam que a foz do Rio Congo era uma área para comércio de escravos que lhes pertencia, a Bélgica defendia o seu fim. Assim criaram um estado independente  e Leopoldo II, da Bélgica como monarca. Ah os reis... 

Com  2a Guerra Mundial, houve um aumento da necessidade de produção de minerais  e la estava o Congo de novo com suas minas.  As bombas de Iroshima  e Nagasaki foram feitas com urânio do Congo! Sua posição estratégica, no centro da África, acirrou ainda mais o interresse e as disputas das potências econômicas pelos seus territórios.

Enquanto isso, a população sofria sob o regime autocrático e paternalista. O sistema educacional organizado pela colónia não abria perspectivas  para os jovens, nem formava lideranças políticas para ao futuro. As lutas pela independência chacoalhavam a Africa. A vizinha Argélia  rompeu seus laços com a França  em 1954, traumaticamente.  O Congo Belga seria o próximo a fazer o mesmo.

Nas vésperas da independência os postos chaves ainda eram  ocupados por belgas. Patrice Lumumba, líder nacionalista congolês, havia dito  em 1957 que: "Quando tivermos suficientes doutores, engenheiros, técnicos, geólogos, administradores e magistrados, aí sim, poderemos pedir nossa independência". A colônia entregou o país  aos congoleses,  no dia 30 de junho de 1960, um país de 14 milhões de habitantes, mais de 200 tribos diferentes, sem unidade nacional, sem experiência administrativa. Resultado: caos. Em poucas semanas de independência a estrutura administrativa do Congo desapareceu, deixando o país sem autoridade. Mais uma vez, agora a ONU clamou por uma intervenção, a intervenção  para a paz e assim foi Samuel Ayres de Lima parar no Congo.

A missão possível

A Força Aérea Brasileira enviou para a República do Congo entre 1960 e 1964  um contingente de 69 oficiais, 110 suboficiais, sargentos e cabos, que tinham o quartel general na cidade de Leopoldville, atual Kinshasa. Eles se destacaram na operacao e manutenção das aeronaves C-47, realizando milhares de horas de voo em condições extremamente difíceis.

Os pilotos brasileiros e consequente oficiais, como o sargento-mecânico Ayres, (foto, primeiro à esquerda) foram alocados no 1° Esquadrão, tendo comandante o Tenente Coronel Indiano (foto).  A babel era grande. O trabalho conjunto com oficiais de vários países como Canada, Sri Lanka, Dinamarca, Irlanda, Noruega, Argentina, Egito, Grécia só para citar alguns,  falando diversas línguas necessitou que os oficiais brasileiros aprendessem o inglês e francês e com certeza para Samuel uma experiência única. Me lembro que do nosso último encontro ele arranhava algumas palavras em inglês.

A missão transportava na maioria material logístico, em apoio das unidades militares, mas também tomavam parte na evacuação da população branca, no transporte de mantimentos para os refugiados e missões de reconhecimento aéreo, com eventual lançamento de folhetins. As tropas permaneceram uma média 8 meses no Congo. Samuel estava no 3° contingente que permaneceu no Congo de Janeiro a setembro de 1962.

Guerra e paz

Residencia dos italianos assassinados por
congoleses, registrado em  20/07/ 1961
As operações eram cercadas de risco e algumas verdadeiras missões de guerra. Uma operação de paz definida pela ONU para ser vitoriosa, não pode representar ameaça para as partes envolvidas, nem ser percebida como tal. Ha de ser exercida com imparcialidade, sem que seus participantes sejam vistos como partes no conflito e isto sem o uso da força de armas. Difícil tarefa. As operações tinham o papel de contribuem para diluir tensões políticas e foi empregada em diversas situações. Mas essa "imparcialidade" nem sempre foi entendida pelas partes conflitantes e assim os soldados da paz eram confundidos com inimigos como aconteceu com 13 militares italianos, que foram mortos na cidade de Kindu pelos congoleses, em novembro de 1961, pouco antes da chegada de Samuel. Os soldados ainda encontraram marcas do massacre nesta casa...


Entre a vida e a vida
O dramático resgate

Sargento Oficial Ayres em seu elemento
Congo, África, 1962
A operação mais dramática e arriscada vivida pelos aviadores brasileiros, foi a evacuação de um grupo de religiosos, feito por helicópteros. Cenas cinematográficas: Pane em um dos helicópteros de resgate. Os nativos congeles iam se aproximando do local, enquanto dos mecânicos tentavam sanar os problemas técnicos. No último minuto outro helicóptero consegue descer e resgatar a tripulação e os civis  que imediatamente alça voo. Segundos depois o helicóptero em pane foi destruído e queimado pelos congoleses. O "triller" durou apenas 15 minutos, 15 longos minutos entre a vida e a vida.

As "boas"... piscinas



Nem tudo era guerra. Nas horas de folga Samuel pode fazer registros da paisagem no clube local. Na década de 60 o vocabulário para as "belas formas" soava diferente e Samuel, fazendo uso da gíria do seu tempo lascou: "Aqui no Congo também tem "Boas"!!! "...  Piscinas ele quis dizer.

Querida Carmem. Toda Roma jamais me proporcionara tanta felicidade  como o momento de poder abraçar a todos

Não preciso tecer mais comentários. Com esta frase, escrita no verso do cartão postal acima enviado de Roma, em 14 de agosto de 1962 termina  sua missão. Samuel Ayres de Lima se despede de Roma. 

O pé de chumbo no Projeto Rondom

De volta ao Brasil a vida seguiu. Após cumpridos o tempo de trabalho, Samuel ia em direção à sua aposendentadoria e... Mas vocês acham que o tio Samuel se aposentou? Que nada! Ele era daqueles que amava o que fazia. Trabalhou de 30 anos no posto de Sargento Oficial  servindo a  FAB como coordenador dos mecânicos de avião e mais 20 anos no  Projeto Rondon, em função administrativa, na Base Aérea de Irere, em Natal. Conhecido por  "pé de chumbo" por sua  honestidade, correção, aliás uma característica dos filhos de Gervásia Maria e José Ayres, chegava ser mesmo um "chato", contou a tia Célia. 

Operacao Zero

E para quem não sabe, o nome Projeto Rondon foi dado em homenagem ao Marechal Candido Mariano da Silva Rondon, bandeirante do século XX que fazia expedições pelo sertão do país, estendendo linhas telegráficas. O projeto foi criado em 11 de julho de 1967 durante a ditadura militar, e tinha como lema "integrar para não entregar", expressando o ideário desenvolvimentista, articulado à doutrina de segurança nacional. Promovia atividades de extensão universitária levando estudantes voluntários às comunidades carentes e isoladas do interior do pais, do norte e nordeste, onde participavam de atividades de caráter assistencial, organizadas pelo Governo e levando a juventude universitária a conhecer de perto a realidade brasileira. 
Entre 1967 até 1989, quando foi extinto o projeto envolveu mais de 370 mil estudantes e professores de todas as regiões do pais. A ideia surgiu em 1966, na Escola de Comando e Estado Maior do Exército, durante a realização de um trabalho de sociologia intitulado "O militar e a sociedade brasileira". A primeira operação do Projeto Rondon, foi  denominada "Operação Zero", teve inicio em 11 de julho de 1967, quando trinta estudantes e dois professores partiram do Rio de janeiro para Rondônia a bordo de uma aeronave C 47, cedida pelo antigo Ministério do Interior, daquele mesmo modelo usado na participação do Brasil na operação de paz da ONU e que com certeza Samuel conhecia cada parafuso da aeronave. A equipe permanecia na área 28 dias, realizando trabalhos de levantamento, pesquisa e assistência médica. No ano seguinte, o projeto contou com a participação de 648 estudantes e foi expandindo para outras áreas.

Em 1970 o Projeto Rondon foi organizado como órgão autônomo da administração e em 1975, transformado em Fundação Projeto Rondon.  As atividades inicialmente desenvolvias apenas durante férias escolares, evoluíram com a criação do campos avançado, dos centro de atuação permanentes e de operações regionais especiais. O projeto passou por novas orientações ao longo dos anos e hoje esta orientado pelos princípios da democracia e responsabilidade social, agora sob a coordenação do Ministério da Defesa trabalhando emparceira com os ministérios da educação, desenvolvimento social, saúde, meio ambiente e continua com o apoio imprescindível das Forças  Armadas no suporte logístico e segurança, necessários às operações.

Voltemos à Samuel. Nos últimos anos de sua definitiva aposentadoria vivia uma vida pacata cercado por  seus familiares, Carmen, a tia Carmem sua esposa,  seu filho Alexandre, sua nora Sandra e seus dois netos, Maria e Alexandro. Ainda do alto de seus 95 anos cumpria a rotina de buscar pão cedinho na padaria. 

Hoje é um dia bom para descansar...

Internado em conseqüência de uma forte crise renal, recebia visitas diárias de seus ente queridos. Alexandre seu filho caçula fazia uma de suas visitas diárias, quando no dia ele lhe disse pensativo  olhando para o céu:  "Hoje é um bom dia para descansar... "
Samuel  Ayres de Lima faleceu de uma parada cardíaca, poucas horas depois da visita, em conseqüência da falência múltipla dos órgãos, no Rio de Janeiro, aos 95 anos.

Fonte: 
A Foça  Aérea Brasileira no Congo (sem autoria)
IBGE
Wikipédia
Fotos: Agradecimentos à neta Maria Ayres pelo envio do arquivo pessoal de fotos de Samuel Ayres de Lima para o Blog da Família Ayres.

quarta-feira, 11 de maio de 2016

Manoel Fernandes de Lima

Manoel Fernandes de Lima, fotografado em
 data desconhecida. Foto: Arquivo privado de
Maria de Lourdes de Deus
Manoel Ayres de Lima, nascido no ano de 1866 filho de José Fernandes Aires, Trançador-pai aqui escrito com "i" e Maria Lima de Souza, batizado a 7 de setembro de 1866 sendo os seus padrinhos Manoel de Seixas Baptista e sua esposa Dona Ignacia Germana Seixas.
O pai escolheu um homem na época "ilustre" para ser padrinho de seu filho, o político Manoel de Seixas Baptista, vereador da cidade de Baependi nos anos de 1870/80. E como era comum dar nome do padrinho à criança batizada então Manoel batizou "Manoel". O padrinho Manoel era também tio de um outro conhecido político, o ex-deputado da província, José Pereira de Seixas, diretor do então Colégio Sao Vicente, no ano de 1887. Manoel de Seixas Baptista devia ser "importante figura" na época pois participou da comissão de comércio para a preparação das festividades da visita da princesa Izabel à Baependi e Caxambu no ano de1868. Na comissão contava com outros "proeminentes políticos" da época, bem como o clero, e toda série de patentes, Alferes, tenentes, bem como comendadores e suas respectivas esposas e  filhas.

Livres?

Quase 20 anos do nascimento de Manoel, em 1888 a Princesa Izabel assina a Lei Área, libertando os escravos de seus grilhões, mas não da pobreza. Sem perspectivas de trabalho os ex-escravos vagavam entre o desemprego e a pobreza absoluta. Muitos ficaram onde estavam: nas fazenda de seus antigos donos, agora como "livres". A tão querida liberdade não trouxe imediata felicidade  a eles.  Livres eles agora podiam contrair casamento, como foi o caso de sua esposa. Ironias da história ele, neto de um senhor de escravos, foi casar justamente com uma descendente deles. Assim aconteceu a grande mistura racial do Brasil se espelhando e alguns ramos de nossa família.



E o "proeminente" padrinho não  ajudaria o afilhado e ele continuaria pobre como tantos outros apadrinhados. Manoel Fernandes casou-se até agora em data e local desconhecidos. Também não sabemos que profissão ele exercia.  Sua esposa, Elisa Candida/Anna Elisa de Lima nasceu por volta de 1861. Elisa, conta a neta, Maria de Lurdes, era filha de escravos.

O casal teve somente 3 filhos: Maria Elisa Lima, nascida em 2 de marco de 1897, apadrinhada pelo comendador Joaquim Pereira Alves Madeira, proprietário de terras na região de Baependi e a protetora Nossa Senhora de Aparecida, Joao de Deus, nascido em 8 de fevereiro de 1902, batizado por Bonifácio José da Silva e Thereza Contestina Soler e Sebastiana Fernandes de Lima, nascida em 9 de outubro de 1904, batizada pelo Capitão João  Baptista Siqueira.

Tragédia 

Casados, Manoel e Elisa, ela  agora livre, fundaram uma pequena família, cercada de tragédias.
Em 1906 falece Elisa de uma lesão no coração, aos 45 anos. Se não bastasse  a infelicidade, falece também  Manoel, dois anos após sua esposa, deixando 3 crianças sem pai nem mãe. Diante do sofrimento alheio Maria José de Lima, a irmã  de Manoel e tia das crianças levou o pequeno João   para ser criado junto com seus outros... 11 filhos. Assim João  cresceu na família Rodrigues de Freitas. O destino e as histórias das duas meninas, espalhadas pelo mundo, Maria Elisa  que tinha 9 anos e Sebastiana  com apenas 2 anos de idade quando perderam sua mãe, ainda esta para ser contado. Sabe-se que elas foram parar no Rio de Janeiro e lá cresceram e fundaram suas família, onde hoje vivem os seus netos e bisnetos.

Laços de família



Em sua curta estada na terra, Manoel como filho mais filho mais velho, foi ser padrinho de casamento do irmão José Ayres de Lima, o Trançador-filho e Gervásia Maria Ayres. Pelo lado de Gervásia, a apadrinhou  o tio dela, Camilo Ferreira Junior, (que fora escravo de João José de Lima e Silva, o avô de Manoel) como vemos na certidão acima e abençoado pelo vigário Marcos Pereia Gomes Nogueira.

Os avós, o passado




Os avós de Manoel Fernandes de Lima, João José de Lima e Silva (1798-1875) e Maria de Souza Lima foram contados no sensu populacional da cidade de Pouso Alto, no ano de 1839, (vide acima), no endereço   Quarteirão 2, Fogo 17, sendo este o mais antigo registro da Família Ayres até agora encontrado. Nele ainda não constava o nome de sua sua mãe, Maria de Lima de Souza, provavelmente nascida posterior a esta data. A família se mudou nos anos de 1850 para a região do Chapéu, município de Baependi e lá trabalharam na terra, como todos os agricultores da região, cultivando fumo, café. João  José de Lima e Silva e alguns de seus filhos  e genros foram possuidores de escravos e com certeza, assim como outros cultivadores de terras, vendiam os seus produtos para Corte do Rio de Janeiro, transportados través da Estrada Real, em lombo de mulas, chamados  "Tropeiros". Mas a prosperidade teve fim. Vários fatores conduziram os seus filhos e netos à pobreza: Com a morte dos pais, as terras herdadas foram divididas e a economia familiar esfacelada. A abolição prometia liberdade para os escravos, mas os agricultores sem alternativas para a imediata substituição de mão de obra na lavoura, foram obrigados a se desfazerem de suas propriedades como foi um clássico exemplo na família, o caso de José Florencio Bernardes, casado com sua tia Thereza Ribeiro de Lima. Ele colocou a propriedade à venda em 1886 coincidindo exatamente com o fim da escravidão.

Algumas dúvidas ainda por esclarecer...

Manoel faleceu às 5 horas da tarde no dia 27 de abril de 1908, como consta na certidão abaixo, como "solteiro". Segundo nossas pesquisas até o momento, não foi encontrado sua certidão de casamento, colocando em dúvida se ele era mesmo oficialmente casado com Elisa. Por ter sido "confessado e encomendado, provavelmente sofreu de doença prolongada, pois houve tempo do padre João  de Deus fazer-lhe visita no leito de morte.
Os tempos passam, a história fica, seus descendentes estão ainda aí para contar e recontar as histórias.



Vejam na árvore genealógica a relação de parentesco




Fonte:
Projeto compartilhar, inventario de Lucinda Meireles Siqueira