Domingo de carnaval em Caxambu. A mimosa cidade das fontes imperiais recebe os últimos veranistas da estação carnavalesca e chora o pranto da chuva de fevereiro, que cai sem cessar, molhando o gramado verde-claro de seus jardins pequeninos e as alamedas do Parque aristocrático, onde muitas gerações de aquáticos diluíram-se esperanças e beberam saudades sob as velhas árvores discretas...
Esta longe o sol deste verão gotejante, que não mostra o azul do céu mineiro na tarde suspirosa nem decerra a cortina branca da chuva para dourar a paisagem da serra. Longe deve estar, também, o espírito contagioso da Folia, que tem medo de subir a montanha e fica na planície, incendiando as almas tropicais...
Como é diferente, aqui no domingo de Carnaval! Não há pandeiros nas ruas nem delírio nos salões. A mesma serenidade dos dias sem muitos se extende sobre a cidade verde, que acolhe os fugitivos do reino do Momo. Só os hotéis e nas aléias do Parque se agita a colmeia de veranistas que fogem não gostar do Rio alucinado de carnaval e de calor... Dos veranistas que vem para estas alturas enganar o próprio temperamento impregnado de alegria...
O meu dileto amigo professor Austregésilo, que aconselha Caxambu aos seus clientes saturados da vibração carioca e dá, ele próprio, o exemplo de um legítimo esteta da ciência, afronta a garoa para não perder a sua alcalina matinal. E vai, sob o chuvisco impertinente, agressivo, até o pavilhão das Fontes Mayrink, onde o Cesar Ladeira, ontem chegado de Carvalho, disciplinado, elegante, à procura da fonte da... Sorte, para ganhar no víspora do Glória ou do Palace.
Também o Roberto Marinho e o Henrique Pongetti se deixam molhar pela chuva deste domingo de carnaval andando pelos caminhos úmidos do Parque, onde não ha uma fonte que cure as inquietações da alma nem a tortura dos corações insaciáveis...
A-apesa-da chuva insistente, da chuva simples e quieta de Caxambu, o Parque desde cedo, se movimenta, galantemente, ao contacto de sorrisos que se abrem como as flores de um vergel primaveril. E as fontes estão sorrindo, também, na música dos copos que procuram as águas claras da saúde, sob o rumos dos pingos que encharcam os canteiros floridos.
Ali na Viotti, ou na D. Pedro, ou ainda na Dona Leopoldina, ou na Duque de Saxe, estacionam, disciplinadamente, donos de fígados responsáveis por muita neurastenia da metrópole. Esperam, pacientemente, sua vez, dominados pela mística das águas...
Junto à Fonte da Beleza há uma nota de inquietação feminina, que merece especial referencência . A água da Fonte da Beleza é prodigiosa. Renova o corpo e a alma de quem a bebe ou com ela banha o rosto castigado pela fealdade ou pelos anos. Tem, neste sentido, um prestígio que a torna procurada por muita veranista que teve a desventura de nascer feia ou perder a beleza depois dos cincoenta... Agora mesmo uma solteirona de idade irremediável faz uso da água milagrosa para sentir, no rosto emurchecido e triste, a carícia fugace da mocidade e da beleza... Suas mãos tremulas seguram, confiantes, o copo cor de esperança, que encerra liquido renovador... A água cai-lhe nos olhos cansados, nas faces perdidas, nos lábios melancólicos, na testa enrugada como esmalte de juventude que talvez lhe traga a beleza que nunca teve a ilusão com que sempre, inutilmente, sonhou... Pobre vítima da fatalidade, ela se consola momentaneamente, com a frescura da fonte que promete... o impossível...
A Fonte da Beleza é a ilusão das matronas desiludidas que visitam Caxambu. É a esperança cristalina das mulheres feias que ainda sonham com a incerteza da formosura.
Entre as suas colegas do Parque suntuoso que, mesmo sob a chuva, se ilumina de sol e azul nas manhãs e nas tarde de fevereiro, a Fonte da Beleza, garrida, primaveril, romântica, generosa, tem a vaidade feminina de todas as mulheres preferias que ainda podem prometer...
O texto foi escrito no contexto dos anos de 1940, e estamos convencidos dos muitos argumentos levantados pelo caro jornalista. Mas discordamos de outros. Ah, talvez o jornalista estivesse olhos somente para as damas, pelo seu exterior, e não via ao seu redor que o Parque das Águas e as fontes eram também procurados por seres humanos de muita beleza interior.
O texto foi escrito no contexto dos anos de 1940, e estamos convencidos dos muitos argumentos levantados pelo caro jornalista. Mas discordamos de outros. Ah, talvez o jornalista estivesse olhos somente para as damas, pelo seu exterior, e não via ao seu redor que o Parque das Águas e as fontes eram também procurados por seres humanos de muita beleza interior.
Fonte:
Capistrano, Martins in Revista Fon-Fon, 1940.
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