logo que desponta a aurora;
águas depois do sol fora,
aguas até a tardinha!
e mais aguas por mezinha
se bebem antes da cea.
Enfim, ninguém faz idéia,
nem pode somar as pipas
d`aguas passadas em tripas!..
muito se bebe e passea! (1)
Água
H2O. Duas moléculas de hidrogênio e uma de oxigênio, elemento fundamental para o surgimento da vida na terra... Na terra das Águas Virtuosas de Caxambu. Sem suas águas Caxambu não existiria e seria somente nome esquecido de uma fazenda ao longo do ribeirão Bengo, pelos idos de 1790. Elas foram a principal razão pela quais inúmeros visitantes acudiam à cidade. As águas ajudaram a curar doenças e salvou a Princesa Isabel da infertilidade. Com sua fama espalhou o nome da cidade para o mundo.
Aquáticos
Aquáticos... no caso, não palmípedes...
Tem cálculos biliares, mal de hepáticos...
Foram buscar remédio - pobres bípedes! -
No jogo... não nas aguas... São "aquáticos"...
E por jogo de amor, ou por amor ao jogo,
Lá se deixam ficar, dois e três meses...
Ferve o Casino. As "aguas"... pegam fogo...
Ha potins novos-ricos e burgueses.
E, mesmo o que perdeu no pano-verde,
Nem por isso voltou mais jururu.
Nas Aguas é assim: mesmo o que perde,
Volta mais lambary, de Caxambú. (3)
O conceito de "aquáticos" esteve sempre associado às aves que habitavam próximos a água. Mas a palavra era usada correntemente para denominar aqueles que vinham à Caxambu fazer uso de suas águas em tratamentos terapêuticos. A primeira referencia da palavra"aquático" consta no livro de Joaquim José Fulgêncio de Castro: Guia para uma Viagem às Aguas Medicinais de Caxambu Província de Minas Gerais, publicado, em 1873, o primeiro livro sobre a cidade e que dava uma descrição sobre a povoação de Caxambu.
Não sabemos a partir de que data os visitantes das outras cidades, como Cambuquira, Lambari, São Lourenço, Poços de Caldas, que também possuíam fontes, foram denominados de "Aquáticos". A palavra foi citada pela primeira vez no jornal O Baependiano, de 1879, no título da comédia Atribulações de um aquático, e em 1881, em uma encenação de teatro e inicia assim sua definição:
(Nicolau) -Mas me diga uma cousa; quem é esta gente que aqui esta?
(Manoel) - São uns Aquáticos que...
(Nicolau) - O que?!
(Manoel) - São uns Aquáticos que vão ao Caxambú.
(Nicolau) - Aquáticos?!
(Manoel) - Sim senhor! Chamao-se Aquáticos as pessoas que vão tomar as águas do Caxambu.
(Nicolau) - Então eu que também vou tomar as águas, vou também tornar-me aquático como qualquer pato ou marreco?!
(Manoel) - Se vai tomar as águas é Aquático; isto é que não tem dúvida alguma.
Henrique Monat em seu livro "Caxambu" editado, em 1894, também dá sua versão para a origem do "Aquático".
"Apesar dos esforços da antiga empresa e da actual, o solo parece apenas batida, o nivelamento é incompleto, e isso facilita as estagnações, quando por uma causa qualquer, os esgotos sofrem um embaraço. Transforma-se então o parque em extenso lamaçal; foi contemplando um dia o parque assim inundado e lembrando-me do imenso pântano, que outrora cobriu todo aquele sitio, que compreendi por que se chamava aquáticos às pessoas que frequentam as fontes; sempre me repugnou a deitar, para justificar o termo, a circunstancia de beber-se aguas medicinais.
Na verdade é que em Saint Amand chamam-se lamacentos (boieux) aos que tomam os banho de lama sulfurosa. Com certeza, o termo aquático veio da comparação, que se fazia, do indivíduo que ia às fontes, atravez do atoleiro e da água estagnada, com os patos e demais aquáticos que ahi viviam."
E não se esqueçam! O aquático mais famoso, um dos primeiros a fazer propaganda do poder curativo de nossas águas, foi o Padre Correia de Almeida.
Aquáticos de Caxambu |
O Baependino, de 1886, continua nos proporcionando histórias e dando suas impressões sobre os diversos "aquáticos" que povoavam as estações de veraneio, nas diversas cidades sulmineiras.
"Gazosas, sulfurosas, férreas, magnesiannas, todas tem fregueses. Os Aquáticos em Lambary distinguem-se pelo gorro e o grande cacete em punho. A ideia de copo onde-tem de beber o precioso liquido não lhes preocupa o espírito, porque sabem que junto à fonte encontraram dous Ganimedes com as respectivas taxas, prontos a servi-los, mediante um ligeiro pour-boire.
Os Aquáticos de Caxambu salienta-se pelo clássico chapéu de linho branco, industrial do logar, e pelo copo que trazem, presos por cordões a tiracolo, ou balançando-o a guia de pêndulo. Os mais elegantes penduram o copinho na ponta da bengala, e lá vai para as fontes, como se partissem para uma pescaria."
No decorrer dos tempos e as possibilidades de locomoção de carro os Aquáticos se visitavam mutualmente e se misturavam no seu visual. Os de São Lourenço vinham à Caxambu, os de Lambari e Cambuquira iam a São Lourenço e vice-versa, e assim quebrava-se a rotina das estações, nas Águas Virtuosas.
Aquáticos de São Lourenço em visita a Lambary |
O último trem dos aquáticos
A terminologia foi muito usada no final do século passado e início do século XX, mas caiu em desuso até desaparecer por completo dos jornais, nos anos de 1940/50. No Jornal O Patriota foi citado somente duas vezes, uma vez em 1927 e outra em 1947. A revista O Cruzeiro 1932, 37, 44, e a partir dos aos 50 a palavra estaria associada ao esportes e não mais os que vinham a Caxambu como turistas. Uma penúltima referencia foi feita pela no Jornal da Manhã do Rio de Janeiro, em 1952: "O trem dos aquáticos", para aqueles que iam em direção ao sul de Minas fazer suas estações de veraneio. A última citação da palavra foi no conto "A lua caiu", na revista O cruzeiro de 1962. A palavra sumiu definitivamente do noticiário, mas os veranistas não.
Enganaquático
E para completar a história da nomenclatura, agora o Enganaquático, um biscoito muito leve de polvilho, comprado pelos turistas, quando ainda era muito cedo para almoçar ou jantar. O biscoitinho em forma redonda era feito na única padaria da cidade e tinha como finalidade "enganar" o estômago dos veranistas, digo, "aquáticos" entres as refeições. Com a fusão das palavras ficou "biscoito enganaquático". Assim o nome esta até hoje na memória e ainda hoje podem ser comprados na cidade, em outra padaria que faz a mesma receita, como patrimônio daquela época.
Todas as sextas feiras, quando meu pai regressava do trabalho, passava na padaria do seu Gabriel e da Dona Boneca e comprava um saco enorme daqueles maravilhosos biscoitos, que sumiam em nossa boca, em poucos minutos. Os biscoitos da foto foram fotografados por Graça Pereira Silveira, numa de suas estadas na cidade. São recordações dos tempos memoráveis, quando a povoação era ainda chamada Águas Virtuosas de Caxambu. As águas? Continuam virtuosas.
Todas as sextas feiras, quando meu pai regressava do trabalho, passava na padaria do seu Gabriel e da Dona Boneca e comprava um saco enorme daqueles maravilhosos biscoitos, que sumiam em nossa boca, em poucos minutos. Os biscoitos da foto foram fotografados por Graça Pereira Silveira, numa de suas estadas na cidade. São recordações dos tempos memoráveis, quando a povoação era ainda chamada Águas Virtuosas de Caxambu. As águas? Continuam virtuosas.
Despedida de Caxambu
Vou me embora, satisfeito
D`estas aguas virtuosas,
Que para curar meu peito
Não são assaz poderosas;
Contudo, me diverti
Com aquáticos por ahi
E aquáticas formosas (2)
Fotos:
Revista Fon-Fon
Biscoitos enganaquáticos de Caxambu por Graça Pereira Silveira, 2016.
Fonte:
(1) Manoel de Almeida Coelho Margarida, em O Baependiano, 1885.
(2) A volta dos "Aquáticos" por Mr. Darlino, em O Careta, 1925
Fonte:
(1) Manoel de Almeida Coelho Margarida, em O Baependiano, 1885.
(2) A volta dos "Aquáticos" por Mr. Darlino, em O Careta, 1925
(3) Jornal O Baependiano
Castro, Coronel Fulgêncio - Guia para uma viagem às AGUAS SDE CAXAMBU PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS - Acompanhada de uma BREVE NOTICIA Sobre a povoação, Rio de Janeiro, 1873.
Castro, Coronel Fulgêncio - Guia para uma viagem às AGUAS SDE CAXAMBU PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS - Acompanhada de uma BREVE NOTICIA Sobre a povoação, Rio de Janeiro, 1873.
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